terça-feira, 1 de agosto de 2017

Nasceu uma ninfa

Ao nascer a menina, os pais debateram longamente o nome que iriam dar-lhe. Como não chegassem a entendimento, decidiram abrir ao acaso o dicionário, e a palavra mais bonita que fosse encontrada na página seria a eleita.
Por isso ela se chamou Oréade. Os pais explicaram às pessoas curiosas que se tratava de ninfa, habitante dos bosques, talvez de Viena, e das montanhas, possivelmente do Sul de Minas. E todos acharam lindo este nome.
Oréade cresceu igualmente linda, mas sua beleza tinha alguma coisa de vegetal, que começava nos olhos verdes, de um verde-musgo, e continuava na doce penugem dos braços, característica de certas folhas amáveis ao tato. Oréade tinha jeito de árvore e de água; seu sorriso era úmido, lembrava a transparência das fontes.
A moça não tinha mor encanto por festas, embora a alegria se estampasse em suas feições. Preferia caminhar a esmo pelas estradas em torno da cidade, subir aos morros, e lá em cima se quedava escutando a música dos passarinhos e outras vozes naturais.
Uma tarde ela não voltou do passeio. Por mais que a procurassem noite afora, e nos dias seguintes, não foi encontrada. Apareceu meses depois de manhãzinha, para uma visita que disse ser breve, e apresentou um fauno a seus pais:
Meu marido.
Eles compreenderam imediatamente que o nome da filha não fora escolhido por força do dicionário, mas de um destino impreterível. Abençoaram a união, e o casal voltou para a serra do Encantamento.
Carlos Drummond de Andrade, in Contos plausíveis

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