Sugiro que você retire numa locadora de
vídeos o filme A língua das mariposas. É só beleza, até
quase o fim, quando os brutos entram em cena. A ditadura de Franco,
na Espanha. Mas acontece o mesmo em todos os lugares. O que
impressiona não é a brutalidade dos brutos. É o que o medo faz com
as pessoas. Medo todo mundo tem. Mas os fracos se agacham,
escondem-se. Falam baixo, olhando para os lados. Fecham portas aos
amigos perseguidos, fingem que não os conhecem. Os amigos viram
perigo. Se batem à porta, logo perguntam: “Será ele? É melhor
não abrir. Fazer de conta que não há ninguém em casa...”. Mas
há aqueles que se sentem em casa com os brutos. Tornam-se delatores.
Delatando, sentem-se participantes do poder dos tiranos. Beijam-lhes
as mãos. Adulam. Lustram-lhes as botas. Aconteceu também no Brasil.
Os seres humanos são iguais em todas as partes do mundo. O filme A
língua das mariposas mostra o que a ditadura de Franco fez com
as pessoas. Até com as crianças. É a estória da amizade entre um
menino e um velho professor, até que foi interrompida…
Rubem Alves, in Do universo à
jabuticaba
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