Paciente
que sou de entrevistas, muita vez atendo a perguntas das mais
estapafúrdias.
— Por
que está escrevendo à mão? Por que não usa a máquina?
—
Porque o tic-tic, o toc-toc ou o pue-pue
da máquina me picota a cuca.
As
entrevistadoras (eram umas menininhas) gostaram do estilo. Foi de
propósito. Especialmente para elas.
Não
que eu seja do tempo da pena de pato, contemporânea do punho de
rendas. Buffon não podia escrever sem punho de rendas, creio que em
atenção ao leitor. No entanto, o pessoal de hoje parece que tira as
calças para escrever. Também em atenção ao leitor. Sinal dos
tempos.
Outra
pergunta, às vezes feita por consulentes mais crescidas:
— Mas
por que o senhor não casou?
—
Porque elas fazem muitas perguntas.
Mas
estas são indagações inocentes. De colegiais. Em certas épocas,
entrevistadores profissionais dão para fazer, todos eles,
insinuações marotas:
— A
poesia deve alienar-se dos problemas sociais?
—
Calma, calma! Peço licença para
observar-lhes que o velho Karl Marx só escrevia poemas de amor...
Aí,
o cara embatuca. Muito obrigado, meu velho Marx.
Aliás,
isto é que é mesmo um sinal dos tempos.
Esses
computadores, que só conhecem o sim e o não, vivem a impor-nos
opções binárias. Se você não é branco, é preto; se você não
é grego, é troiano; se não é da esquerda, é da direita. Onde “a
encruzilhada de um talvez”, como dizia o hoje tão esquecido
Euclides da Cunha?
Pelo
visto, somos uns robôs totalitários. Isto é, desconhecemos as
dúvidas e as nuanças, antigos signos da inteligência.
Mário
Quintana, in A vaca e o hipogrifo
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