quarta-feira, 7 de junho de 2017

Perguntas & respostas

Paciente que sou de entrevistas, muita vez atendo a perguntas das mais estapafúrdias.
Por que está escrevendo à mão? Por que não usa a máquina?
Porque o tic-tic, o toc-toc ou o pue-pue da máquina me picota a cuca.
As entrevistadoras (eram umas menininhas) gostaram do estilo. Foi de propósito. Especialmente para elas.
Não que eu seja do tempo da pena de pato, contemporânea do punho de rendas. Buffon não podia escrever sem punho de rendas, creio que em atenção ao leitor. No entanto, o pessoal de hoje parece que tira as calças para escrever. Também em atenção ao leitor. Sinal dos tempos.
Outra pergunta, às vezes feita por consulentes mais crescidas:
Mas por que o senhor não casou?
Porque elas fazem muitas perguntas.
Mas estas são indagações inocentes. De colegiais. Em certas épocas, entrevistadores profissionais dão para fazer, todos eles, insinuações marotas:
A poesia deve alienar-se dos problemas sociais?
Calma, calma! Peço licença para observar-lhes que o velho Karl Marx só escrevia poemas de amor...
Aí, o cara embatuca. Muito obrigado, meu velho Marx.
Aliás, isto é que é mesmo um sinal dos tempos.
Esses computadores, que só conhecem o sim e o não, vivem a impor-nos opções binárias. Se você não é branco, é preto; se você não é grego, é troiano; se não é da esquerda, é da direita. Onde “a encruzilhada de um talvez”, como dizia o hoje tão esquecido Euclides da Cunha?
Pelo visto, somos uns robôs totalitários. Isto é, desconhecemos as dúvidas e as nuanças, antigos signos da inteligência.
Mário Quintana, in A vaca e o hipogrifo

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