Nosso
conhecimento não era de estudar em livros.
Era
de pegar de apalpar de ouvir e de outros sentidos.
Seria
um saber primordial?
Nossas
palavras se ajuntavam uma na outra por amor
e
não por sintaxe.
A
gente queria o arpejo. O canto. O gorjeio das palavras.
Um
dia tentamos até de fazer um cruzamento de árvores
com
passarinhos para obter gorjeios em nossas palavras.
Não
obtivemos.
Estamos
esperando até hoje.
Mas
bem ficamos sabendo que é também das percepções
primárias que nascem arpejos e canções
e gorjeios.
Porém
naquela altura a gente gostava mais das palavras desbocadas.
Tipo
assim: Eu queria pegar na bunda do vento.
O
pai disse que vento não tem bunda.
Pelo
que ficamos frustrados.
Mas
o pai apoiava a nossa maneira de desver o mundo
que
era a nossa maneira de sair do enfado.
A
gente não gostava de explicar as imagens
porque
explicar afasta as falas da imaginação.
A
gente gostava dos sentidos desarticulados como
a
conversa dos passarinhos no chão a comer pedaços de mosca.
Certas
visões não significavam nada mas eram passeios verbais.
A
gente sempre queria dar brazão às borboletas.
A
gente gostava bem das vadiações com as palavras
do
que das prisões gramaticais.
Quando
o menino disse que queria passar para
as
palavras suas peraltagens até os caracóis apoiaram.
A
gente se encostava na tarde como se a tarde fosse um poste.
A
gente gostava das palavras quando elas perturbavam
os
sentidos normais da fala.
Esses
meninos faziam parte do arrebol
como
os passarinhos.
Manoel
de Barros
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