O
aparecimento de objetos voadores não identificados, nos arredores de
Rutilândia, tornou-se tão frequente que o semanário A Razão
Prática passou a chamá-los de objetos voadores identificados.
Tinham
a mesma configuração, distinguindo-se uns dos outros apenas por
sinais diferentes, gravados na fuselagem. Seus tripulantes
entendiam-se normalmente com os moradores, não hesitando em
solicitar-lhes pequenos serviços: copo d’água, comprimido para
dor de cabeça. Ofereciam pequenas lembranças, como chaveiros e
mesmo chaves, de matéria maleável, que serviam para toda espécie
de fechaduras, mas advertindo que deviam ser usadas de brincadeira.
No
fim de alguns meses de convivência pacífica, um dos tripulantes
casou-se com a filha do prefeito, embora os companheiros o
advertissem de que não podia residir em Rutilândia, pois deviam
todos regressar ao lugar de origem. Ele respondeu que preferia ficar
por ali mesmo, uma vez que sua mulher enjoava no interior do disco.
“Mas você faltará ao dever deixando de voltar conosco” —
retorquiram. Ele respondeu: “Que é o dever, depois de ser cumprido
por muito tempo? O dever é uma chateação”. O prefeito ficou do
seu lado, oferecendo cobertura para o caso de quererem levá-lo à
força. Em Rutilândia há duas crianças encantadoras, filhas de uma
jovem da sociedade local e de ex-tripulante de objeto voador
identificado. Mas receia-se a todo momento que sejam raptadas.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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