Que
é um tirso? No sentido moral e poético, é um símbolo com que os
sacerdotes e sacerdotisas celebram a divindade da qual são os
intérpretes e os servidores. Mas, fisicamente, é apenas um pau, um
simples pau, uma estaca de lúpulo, ou um esteio de vinha, seco, duro
e direito. Em volta desse pau, em meandros caprichosos, divertem-se e
brincam hastes e flores, umas sinuosas e fugidias, outras pendendo
como sinos ou taças derrubadas. Uma glória fantástica jorra dessa
complexidade de linhas e de cores, pálidas ou brilhantes. Dir-se-ia
que a linha curva e a espiral fazem a corte à linha reta e dançam
ao redor de uma silenciosa adoração. Dir-se-ia que todas essas
corolas delicadas, todos esses cálices, explosões de aromas e de
cores, executam um místico fandango em torno do bastão hierático.
Todavia, que imprudente mortal ousará decidir se as flores e os
pâmpanos foram feitos para o bastão, ou se o bastão é apenas o
pretexto para mostrar a beleza dos pântanos e das flores? O tirso é
a representação da vossa maravilhosa dualidade, senhor poderoso e
venerado, caro Bacante da Beleza misteriosa e apaixonada. Ninfa
alguma, exasperada pelo invencível Baco, sacudiu o tirso sobre as
cabeças das companheiras, enlouquecidas com a energia e o capricho
com que agitais o vosso gênio sobre os corações dos vossos irmãos.
O bastão é a vossa vontade, reta, firme e inabalável. As flores, o
passeio de vossa fantasia em torno de vossa vontade. É o elemento
feminino executando em volta do macho as suas prestigiosas piruetas.
Linha reta e linha arabesca, intenção e expressão, tensão da
vontade, sinuosidade do verbo, unidade do fim, variedade dos meios,
amálgama todo-poderoso e indivisível do gênio: que analista terá
a detestável coragem de vos dividir e separar? Caro Liszt, através
das brumas, para além dos rios, acima das cidades onde os pianos
cantam a vossa glória, onde a imprensa traduz a vossa sabedoria, em
qualquer parte que vos encontreis, nos esplendores da cidade eterna
ou nas brumas dos países sonhadores que Cambrinus consola,
improvisando canções alegres ou de inefável dor, ou confiando ao
papel vossas meditações abstrusas, cantor da Volúpia e da Angústia
eternas, filósofo, poeta e artista, eu vos saúdo na imortalidade!
Charles
Baudelaire, in Pequenos poemas em prosa
Nenhum comentário:
Postar um comentário