Ora,
até que enfim chegou o outono, o outono de azulejo e porcelana. Olho
(estou na nossa velha praça da Alfândega) a estátua equestre do
general. Estão ambos verdes, num louvável mimetismo, contra o verde
das árvores ao fundo, especialmente o daquele belíssimo guapuruvu,
já cantado por Nogueira Leiria.
Quero
crer que o Leiria se foi antes que houvessem cortado um braço
lateral da sua árvore, quebrando a bela simetria da copa. Espero que
não tenha saído sangue dessa amputação, como aconteceu com a
árvore no poema “O lenhador”, de Catulo da Paixão Cearense.
Olho,
para disfarçar, os guris no tobogã. Meu sorriso interior, no
entanto, fica em meio. Porque esses guris em breve vão perecer. Isto
é, vão perder a infância, a inocência animal, para ganhar em
troca, no mínimo, uma sonsice social. E ostentarão esse falso
cinismo da adolescência, mais perdoável, aliás, que o cinismo
rancoroso dos velhos.
Mas,
por enquanto, ainda estão estragando por aí os fundilhos. E que
brilho nas caras de maçãs, acesas na escorregadela a jato! A tarde
mira-se nos seus olhos. Repara bem no que te digo: a tarde é que se
mira nos seus olhos, que se limitam a refletir as coisas, em vez de
refletir sobre as coisas. Eles estão na vida como peixes n’água:
sem saber. E no mesmo contínuo movimento.
Mário
Quintana, in A vaca e o hipogrifo
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