quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Tina

Tina Modotti 

Julio Antonio Mella, revolucionário cubano, vive no exílio no México. Uma noite de 1929, Mella caminha de braços dados com sua companheira, Tina Modotti, quando os assassinos o liquidam a tiros.
Tina grita, mas não chora frente ao corpo caído.
Tina chora depois, quando chega em casa, ao amanhecer, e vê os sapatos de Mella, vazios, como que esperando por ele debaixo da cama.
Até poucas horas antes, esta mulher era tão feliz que sentia inveja dela mesma.
O governo de Cuba não tem nada a ver, afirmam os jornais mexicanos de direita. O exilado foi vítima de um crime passional, digam o que digam a judiada do bolchevismo moscovita. A imprensa revela que Tina Modotti, mulher de duvidosa decência, reagiu com frieza frente ao trágico episódio e posteriormente, em suas declarações à polícia, incorreu em contradições suspeitas.
Tina, fotógrafa italiana, soube penetrar o México, muito a fundo, nos poucos anos que está aqui. Suas fotografias oferecem um espelho de grandeza às coisas simples de cada dia e à simples gente que aqui trabalha com as mãos.
Mas ela tem a culpa da liberdade. Vivia sozinha quando descobriu Mella, misturado na multidão que se manifestava por Sacco e Vanzetti e por Sandino, e se uniu a ele sem matrimônio. Antes tinha sido atriz de Hollywood e mod elo e amante de artistas; e não há homem que ao vê-la não fique nervoso. Trata-se, portanto, de uma perdida – e para piorar, estrangeira e comunista. A polícia distribui fotos que mostram nua sua imperdoável beleza, enquanto começam as gestões para expulsá-la do México.
Eduardo Galeano, in Mulheres

Nenhum comentário:

Postar um comentário