quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Sempre desconfiei

http://www.learner.org/courses/globalart/assets/non_flash_796/work_059.jpg
Sonho causado pelo voo de uma abelha ao redor de uma romã um segundo antes de acordar (1944), de Salvador Dali


Sempre desconfiei de narrativas de sonhos. Se já nos é difícil recordar o que vimos despertos e de olhos bem abertos, imagine-se o que não será das coisas que vimos dormindo e de olhos fechados... Com esse pouco que nos resta, fazemos reconstituições suspeitamente lógicas e pomos enredo, sem querer, nas ocasionais variações de um calidoscópio. Me lembro de que, quando menino, minha gente acusava-me de inventar os sonhos. O que me deixava indignado.
Hoje creio que ambas as partes tínhamos razão.
Por outro lado, o que mais espantoso há nos sonhos é que não nos espantamos de nada. Sonhas, por exemplo, que estás a conversar com o tio Juca. De repente, te lembras de que ele já morreu. E daí? A conversa continua.
Com toda a naturalidade.
Já imaginaste que bom se pudesses manter essa imperturbável serenidade na vida propriamente dita?
Mário Quintana, in A vaca e o hipogrifo

Nenhum comentário:

Postar um comentário