Sonho causado pelo voo de uma abelha ao redor de uma romã um segundo antes de acordar (1944), de Salvador Dali
Sempre
desconfiei de narrativas de sonhos. Se já nos é difícil recordar o
que vimos despertos e de olhos bem abertos, imagine-se o que não
será das coisas que vimos dormindo e de olhos fechados... Com esse
pouco que nos resta, fazemos reconstituições suspeitamente lógicas
e pomos enredo, sem querer, nas ocasionais variações de um
calidoscópio. Me lembro de que, quando menino, minha gente
acusava-me de inventar os sonhos. O que me deixava indignado.
Hoje
creio que ambas as partes tínhamos razão.
Por
outro lado, o que mais espantoso há nos sonhos é que não nos
espantamos de nada. Sonhas, por exemplo, que estás a conversar com o
tio Juca. De repente, te lembras de que ele já morreu. E daí? A
conversa continua.
Com
toda a naturalidade.
Já
imaginaste que bom se pudesses manter essa imperturbável serenidade
na vida propriamente dita?
Mário
Quintana, in A vaca e o hipogrifo
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