sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Manuela

Em Potosí, em 1825, Bolívar sobe ao topo do morro de prata. Fala Bolívar, falará a História: Esta montanha cujo seio é o assombro e a inveja do Universo... Ao vento as bandeiras das novas pátrias e os sinos de todas as igrejas. Eu estimo em nada esta opulência quando a comparo... Mil léguas abraçam os braços de Bolívar. Os vales multiplicam as salvas dos canhões e o eco das palavras: ...com a glória de ter trazido vitorioso o estandarte da liberdade lá das ardentes e distantes praias... Falará a História do prócer na altura. Nada dirá das mil rugas na cara desse homem, ainda não usada pelos anos mas talhada fundo pelos amores e pelas dores. A História não se ocupará dos potros que galopam em seu peito enquanto abraça a terra como se fosse mulher, lá dos céus de Potosí. A terra como se fosse essa mulher: a que afia as espadas dele, e com um só olhar o despe e perdoa. A que sabe escutá-lo por baixo do trovão dos canhões e os discursos e as ovações, quando ele anuncia: Tu estarás sozinha, Manuela. E eu estarei sozinho no meio do mundo. Não haverá outro consolo além da glória de termos vencido.
Eduardo Galeano, in Mulheres

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