A
poesia gosta mesmo é de coisas simples. Basta uma imagem banal. A
Adélia Prado é especialista em fazer poesias com insignificâncias.
Quiabos “chifre de veado”, ora-pro-nobis, tanajuras, galinhas,
ovos, escamação de peixes, galinhas de bico aberto, a mãe cantando
enquanto cozinhava exatamente arroz, feijão-roxinho e molho de
batatinhas: com essas coisas ela faz poesia. Pois poesia é feito
caleidoscópio: faz beleza com caquinhos de vidro. Por que é que os
poetas são assim tão ligados às insignificâncias? Porque é com
insignificâncias que a vida é feita. Pois eu escrevi sobre a
insignificância de chupar laranjas... O Zé, marido da Adélia, me
mandou e-mail imediato lá de Divinópolis, juntando-se a minha
conversa sobre os jeitos de chupar laranja. E ele me disse que por lá
os pobres também chupavam de gomo. Só que enfiavam o gomo inteiro
na boca, depois cuspiam os caroços e engoliam o bagaço. Isso, por
causa da prisão de ventre. Se eu escrevi e o Zé me respondeu é
porque a amizade se faz com insignificâncias. Em Minas Gerais até
jeito de chupar laranja é poesia…
Rubem
Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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