terça-feira, 26 de julho de 2016

As libertadoras

As cidades espanholas do Novo Mundo, nascidas como oferendas a Deus e ao rei, têm um vasto coração de terra pisada. Na Praça Maior estão o cadafalso e a casa de governo, a catedral e o cárcere, o tribunal e o mercado. Perambula o gentio ao redor da forca e da fonte de água; na Praça Maior, praça forte, praça de armas, se cruzam o cavalheiro e o mendigo, o senhor de esporas de prata e o escravo descalço, as beatas que levam a alma à missa e os índios que trazem a chicha, aguardente de milho fermentado, em barrigudas vasilhas de barro.
Hoje tem espetáculo na Praça Maior de La Paz. Duas mulheres, caudilhas de levantamentos indígenas, serão sacrificadas. Bartolina Sisa, mulher de Túpac Catari, vem do quartel com uma corda no pescoço, amarrada ao rabo de um cavalo. Gregoria Apaza, irmã de Túpac Catari, vem montada num burrinho. Cada uma leva um pedaço de pau, como se fosse um cetro, na mão direita, e cravada na testa, uma coroa de espinhos. Na frente, os presos varrem o caminho com galhos. Bartolina e Gregoria dão várias voltas na praça, sofrendo em silêncio as pedradas e as risadas dos que caçoam delas por serem rainhas de índios, até que chega a hora da forca. Suas cabeças e suas mãos, manda a sentença, serão exibidas pelas aldeias da região.
O sol, o velho sol, também assiste à cerimônia.
Eduardo Galeano, in Mulheres

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