Um
dia eu estava andando de carro com meu amigo Carlos Rodrigues
Brandão, em Pocinhos, por uma estrada de terra. Aí ele começou uma
conversa mole sobre a memória. Disse-me: “Rubem, estou agora
seguindo a seguinte filosofia: eu não possuo aquilo de que me
esqueci. O que é que você acha disso?”. Pensei: Eu me esqueci da
coisa que possuo. Se me esqueci dela é como se ela não existisse
para mim. Não vou usá-la nem sentirei a sua falta. E concluí:
“Está certo: eu não possuo aquilo de que me esqueci”. Aí a
fala mole do Brandão ficou rápida e concluiu: “Você se esqueceu
de que eu lhe devo R$200,00. Portanto, você não os possui mais. Vou
dá-los para a Soninha comprar tijolos...”. Soninha era uma amiga
comum que estava lutando para construir sua casa. E assim ele o fez.
E eu não pude reclamar porque havia acabado de concordar que não
possuo aquilo de que me esqueci... Eu havia me esquecido de que o
Brandão me devia R$200,00.
Rubem
Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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