Outro
dia fui a São Paulo e resolvi voltar à noite, uma noite de vento
sul e chuva, tanto lá como aqui. Quando vinha para casa de táxi,
encontrei um amigo e o trouxe até Copacabana; e contei a ele que lá
em cima, além das nuvens, estava um luar lindo, de lua cheia; e que
as nuvens feias que cobriam a cidade eram, vistas de cima,
enluaradas, colchões de sonho, alvas, uma paisagem irreal.
Depois
que o meu amigo desceu do carro, o chofer aproveitou um sinal fechado
para voltar-se para mim:
— O
senhor vai desculpar, eu estava aqui a ouvir sua conversa. Mas, tem
mesmo luar lá em cima?
Confirmei:
sim, acima da nossa noite preta e enlamaçada e torpe havia uma outra
— pura, perfeita e linda.
— Mas,
que coisa...
Ele
chegou a pôr a cabeça fora do carro para olhar o céu fechado de
chuva. Depois continuou guiando mais lentamente. Não sei se sonhava
em ser aviador ou pensava em outra coisa.
— Ora,
sim senhor...
E,
quando saltei e paguei a corrida, ele me disse um “boa noite” e
um “muito obrigado ao senhor” tão sinceros, tão veementes, como
se eu lhe tivesse feito um presente de rei.
Rubem
Braga, in Ai de ti, Copacabana
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