O
então desconhecido Estevão Azevedo estampou manchetes na mídia
potiguar na última semana por um motivo nobre. O jovem escritor
natalense de 37 anos teve seu romance Tempo
de Espalhar Pedras vencedor
no prestigiado Prêmio São Paulo de Literatura, que concede a melhor
premiação em dinheiro entre todos do gênero no Brasil. Estevão
desbancou alguns dinossauros das nossas letras, a exemplo de Chico
Buarque e Cristovão Tezza. Mas não foi com um livro de estreia. O
autor também foi finalista em 2009 com o livro Nunca o Nome do
Menino. Mas quem é Estevão? Do que brota sua literatura? O blog
entrou em contato com ele na terça-feira, elaborou rapidamente
algumas perguntas básicas e as enviou por e-mail logo depois, com a
promessa das respostas no fim de semana ante o “turbilhão” de
entrevistas solicitadas. Promessa cumprida, o simpático natalense
conta um pouquinho de si logo abaixo:
Sergio
Vilar – Breve biografia.
Estevão
Azevedo – Eu
nasci em Natal, em 1978. Saí de lá muito cedo, com uns três ou
quatro anos, e só voltei muito mais tarde, para visitar familiares
ou como turista. Vivi quase toda a vida em São Paulo. Aqui estudei
primeiro jornalismo, depois letras. Trabalhei com tecnologia da
informação por mais de uma década e, nos últimos sete anos mais
ou menos venho trabalhando como editor de livros.
Influências
literárias de ontem e de hoje?
Eu
não diria influências, porque tudo nos influencia, não só aquilo
de que gostamos. Exemplo: por odiar um escritor canônico, alguém
pode enveredar por um caminho oposto na literatura. Nesse caso, esse
alguém foi influenciado por um escritor que odeia. Além disso, é
muito difícil, num caldo tão efervescente de cultura, com estímulos
de todo o lado, isolar e até mesmo detectar o que nos influencia.
Por isso vou citar apenas uns poucos autores de tantos que gosto ou
gostei: Borges, Raduan Nassar, Nabokov, John Cheever, Tchekhov,
Philip Roth, Drummond.
Qual
seu livro de cabeceira atual?
Em
Busca do Tempo Perdido, do Proust. Agora que terminei depois de três
anos um mestrado, quero ler todos os volumes na sequência.
Proust
é exageradamente detalhista…
É
muito. Cem páginas só no narrador tentando dormir certa noite e
esperando o beijo da mãe.
Quando
começou a escrever? Que tipo de escrita?
Literatura
pra valer, no melhor sentido do termo, eu comecei a escrever no
início da vida universitária. Contos esparsos, alguns imaturos,
outros ruins, alguns que me agradam até hoje. Só depois que
publiquei o primeiro livro com alguns desses contos me aventurei na
tentativa (que eu supunha impossível de dar certo) de escrever um
romance.
Como
se dá o processo de seus romances? Mais inspiração ou expiração?
Há uma rotina definida?
Não
há rotina. Como escrevi os livros durante períodos de trabalho,
estudo e vida cotidiana intensos, sempre precisei dos poucos
intervalos restantes, algumas noites, alguns fins de semana. Até por
isso sempre demoro muito a terminar um texto mais longo. Há
inspiração quando, dentre as infinitas possibilidades da linguagem,
eu elejo a próxima palavra, e a próxima, e a próxima. Essa
inspiração só é possível, imagino, porque houve um acúmulo de
leitura, de tentativas malogradas de escrita, de elucubração
durante os instantes em que não estou escrevendo. Ou seja, a opção
feita por intuição só é possível por conta de uma grande
quantidade de material introjetada, fruto de uma dedicação. A
palavra, frase ou imagem que vem aparentemente do nada ou do
inconsciente na verdade foi gestada por muito tempo.
A
quem você confia revisão e opiniões dos seus livros?
A alguns pouco amigos e aos profissionais da editora que vai publicá-los.
A alguns pouco amigos e aos profissionais da editora que vai publicá-los.
Em
2009 você já havia sido finalista do mesmo Prêmio São Paulo de
Literatura com o livro Nunca o Nome do Menino. Você sentiu alguma
evolução para este premiado Tempo de Espalhar Pedras?
Evolução
é uma palavra complicada pois traz em si um juízo de valor: o que
vem depois é sempre melhor (mais adaptado, se formos darwinistas).
Eu diria que há, entre as muitas diferenças, uma importante: o
estilo de Tempo de Espalhar Pedras, por necessidade da trama e do
narrador em terceira pessoa, é um pouco mais equilibrado, um pouco
menos ornamentado do que o de Nunca o Nome do Menino, romance narrado
em primeira pessoa por uma personagem em pleno turbilhão
existencial.
O
livro tem como cenário uma área de mineração. Esse ofício fez
parte de alguma maneira de sua vivência? Por que essa escolha? Foi
preciso muita pesquisa? Como se deu a construção dos personagens?
Nunca
pus os pés num garimpo de diamante, nem tenho nenhum afeto especial
pela profissão ou pelo tema. A questão da escolha é que, durante
uma trilha por uma antiga região de mineração, ouvi de um guia uma
história que me pareceu fortíssima: a do vilarejo de garimpeiros
que é destruído pelos próprios moradores, que buscam as últimas
pedras preciosas da região debaixo do piso das casas, nas ruas, nas
praças. Segundo ele aquilo tinha acontecido mesmo décadas antes. Me
pareceu uma alegoria poderosa dos desejos humanos que levam à
destruição. Para construir o romance, fiz pesquisa em outros textos
literários, brasileiros que tratavam de temas que me interessavam:
garimpo, nordeste, sertão, vingança, fome, lascívia, paternidade.
A
editora de seu livro premiado, a Cosac Naify, fechou as portas. Por
outro lado, vemos crescimento nos e-books. Qual futuro você vê no
livro e na leitura no Brasil?
Os
livros digitais representam uma fatia insignificante ainda do
mercado. Devem crescer e se tornar mais populares, mas o livro físico
nunca deixará de existir. É um objeto absurdamente eficiente, por
isso durou tantos séculos no formato atual. É portátil,
confortável, durável, bonito e não depende de nenhuma fonte de
energia para funcionar. O Brasil tem um mercado editorial pequeno,
poucas livrarias, poucos leitores. Tudo isso, é claro, fruto de uma
educação paupérrima, indigente. Sem melhorias nessa área, quem
gosta ou vive de livros sempre terá poucos espaços.
Sérgio
Vilar,
in www.substantivoplural.com.br
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