terça-feira, 3 de novembro de 2015

Sofrimento

Aquela mesma angústia fria, aquela dor sem doer que se espalha pelo corpo inteiro. Arrumo, desarrumo, faço, e refaço. Ah, como é difícil ser calmo. Encho-me de remédios vou à janela:é a noite, a noite dos homens, a minha noite. Ruídos de carros que passam na escuridão. Rádios abertos. Vultos que transitam em apartamentos acesos. E eu, e eu? Onde vou, que faço?
Ouço a voz de Cornélio Penna naquele tempo - “o seu sofrimento é um sofrimento bom, de permanecer à margem”. Não há, Cornélio, pior sofrimento do que permanecer à margem. Não tenho temperamento para isto. Quero amar, viajar, esquecer – quero terrivelmente a vida, porque não creio que exista nada de mais belo e nem de mais terrível do que a vida. E aqui estou: tudo o que amo não me ouve mais, e eu passo com a minha lenda, forte sem o ser, príncipe, mas esfarrapado.
Lúcio Cardoso, in Diários

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