Aquela mesma angústia fria, aquela dor
sem doer que se espalha pelo corpo inteiro. Arrumo, desarrumo, faço,
e refaço. Ah, como é difícil ser calmo. Encho-me de remédios vou
à janela:é a noite, a noite dos homens, a minha noite. Ruídos de
carros que passam na escuridão. Rádios abertos. Vultos que
transitam em apartamentos acesos. E eu, e eu? Onde vou, que faço?
Ouço a voz de Cornélio Penna naquele
tempo - “o seu sofrimento é um sofrimento bom, de permanecer à
margem”. Não há, Cornélio, pior sofrimento do que permanecer à
margem. Não tenho temperamento para isto. Quero amar, viajar,
esquecer – quero terrivelmente a vida, porque não creio que exista
nada de mais belo e nem de mais terrível do que a vida. E aqui
estou: tudo o que amo não me ouve mais, e eu passo com a minha
lenda, forte sem o ser, príncipe, mas esfarrapado.
Lúcio
Cardoso, in Diários
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