segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Meu avesso

Se chegarem as gentes, diga que vivo o meu avesso.
Que há um vivaz escarlate
Sobre o peito de antes palidez, e linhos faiscantes
Sobre as magras ancas, e inquietantes cardumes
Sobre os pés.
Que a boca não se vê, nem se ouve a palavra

Mas há fonemas sílabas sufixos diagramas
Contornando o meu quarto de fundo sem começo.
Que a mulher parecia adequada numa noite de antes
E amanheceu como se vivesse sob as águas.
Crispada.
Flutissonante.

Diga-lhes principalmente
Que há um oco fulgente num todo escancarado.
E um negrume de traço nas paredes de cal
Onde a mulher-avesso se meteu.

Que ela não está neste domingo à tarde, apropriada.
E que tomou algália
E gritou às galinhas que falou com Deus.
Hilda Hilst

Nenhum comentário:

Postar um comentário