Saber
que será má a obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a
que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será
pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha
vizinha aleijada. Essa planta é a alegria dela, e também por vezes
a minha. O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns
momentos de distração de pior a um ou outro espírito magoado ou
triste. Tanto me basta, ou me não basta, mas serve de alguma
maneira, e assim é toda a vida.
Um
tédio que inclui a antecipação só de mais tédio; a pena, já, de
amanhã ter pena de ter tido pena hoje — grandes emaranhamentos sem
utilidade nem verdade, grandes emaranhamentos…
… onde,
encolhido num banco de espera da estação apeadeiro, o meu desprezo
dorme entre o gabão do meu desalento…
… o
mundo de imagens sonhadas de que se compõe, por igual, o meu
conhecimento e a minha vida…
Em
nada me pesa ou em mim dura o escrúpulo da hora presente. Tenho fome
da extensão do tempo, e quero ser eu sem condições.
Fernando
Pessoa, in O
livro do desassossego
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