Porque será que tem gente que vive se metendo com que os outros estão fazendo? Pode haver coisa mais ingênua do que um menininho brincando com areia, na beira da praia? Não pode, né? Pois estávamos nós deitados a doirar a pele para endoidar mulher, sob o sol de Copacabana, em decúbito ventral (não o sol, mas nós) a ler "Maravilhas da Biologia", do do coleguinha cientista Benedict Knox Ston, quando um camarada se meteu com uma criança, que brincava com a areia.
Interrompemos a leitura para ouvir a conversa. O menininho já estava com um balde desses de matéria plástica cheio de areia, quando o sujeito intrometido chegou e perguntou o que é que o menininho ia fazer com aquela areia. O menininho fungou, o que é muito natural, pois todo menininho que vai na praia funga, e explicou pro cara que ia jogar a areia num casal que estava numa barraca lá adiante. E apontou para a barraca.
Nós
olhamos, assim como olhou o cara que perguntava ao menininho. Lá, na
barraca distante, a gente só conseguia ver dois pares de pernas ao
sol. O resto estava escondido pela sombra, por trás da barraca. Eram
dois pares, dizíamos, um de pernas femininas, o que se notava pela
graça da linha, e outro masculino, o que se notava pela abundante
vegetação capilar, se nos permitem o termo.
— Eu
vou jogar a areia naquele casal por causa de que eles estão se
abraçando e se beijando muito — explicou o menininho, dando outra
fungada.
O
intrometido sorriu complacente e veio com lição de moral.
— Não
faça isso, meu filho — disse ele (e depois viemos a saber que o
menino era seu vizinho de apartamento). Passou a mão pela cabeça do
garotinho e prosseguiu: — deixe o casal em paz. Você ainda é
pequeno e não entende dessas coisas, mas é muito feio ir jogar
areia em cima dos outros.
O
menininho olhou pro cara muito espantado e ainda insistiu:
— Deixa
eu jogar neles.
O
camarada fez menção de lhe tirar o balde da mão e foi mais
incisivo:
— Não
senhor. Deixe o casal namorar em paz. Não vai jogar areia não.
O
menininho então deixou que ele esvaziasse o balde e disse: — Tá
certo. Eu só ia jogar areia neles por causa do senhor.
— Por minha causa? — estranhou o chato. — Mas que casal é aquele?
— O homem eu não sei — respondeu o menininho. — Mas a mulher é sua.
— Por minha causa? — estranhou o chato. — Mas que casal é aquele?
— O homem eu não sei — respondeu o menininho. — Mas a mulher é sua.
Sérgio
Porto (o Stanislaw Ponte Preta),
in O melhor do
Stanislaw
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