sexta-feira, 7 de março de 2014

Protesto

Não é no teu corpo que se imola
para a ceia dos meus sentidos
a vítima núbil, a áurea mola
que cinge o amor recente aos idos.

         Mas é também no teu corpo que corre
         o sangue que o meu sangue socorre.

Não é no teu corpo que se ergue
a guerra fria dos meus nervos.

nem nasceram tuas transparências
para a cegueira dos meus dedos.

         Mas é também no teu corpo insano
         que perscruto meu desconforto humano.

Não é no teu corpo, nos teus olhos
de fauno, que colho as minhas ditas,
nem o jasmim de tua boca flore
para a visão que me solicita.

         Mas é também no teu corpo único
         que o amor à forma do Amor reúno.

Não é no teu corpo que concentro
minha sede (esta sede ferina
que morre de seu farto alimento
e vive de quanto se elimina)

         Mas é também teu corpo a medida
         destas águas sobre a minha ferida.

Não é no teu corpo, mas é tanto
no teu corpo meu último refúgio,
que amoroso e em pânico me insurjo
contra a fonte que és: júbilo e pranto.

         Mas é também no teu corpo o tudo
         da solidão em que me aclaro e escudo.

         Em teu corpo, canal que brande e acalma
         minha alma, este pássaro árduo e mudo
         na estranha migração da tua alma.
Walmir Ayala

Nenhum comentário:

Postar um comentário