"A educação atual e as atuais conveniências sociais
permeiam o cidadão e imolam o homem. Nas condições modernas, os seres humanos
vêm a ser identificados com as suas capacidades socialmente valiosas. A
existência do resto da personalidade ou é ignorada ou, se admitida, é admitida
somente para ser deplorada, reprimida ou, se a repressão falhar,
sub-repticiamente rebuscada. Sobre todas as tendências humanas que não conduzem
à boa cidadania, a moralidade e a tradição social pronunciam uma sentença de
banimento. Três quartas partes do Homem são proscritas. O proscrito vive
revoltado e comete vinganças estranhas. Quando os homens são criados para serem
cidadãos e nada mais, tornam-se, primeiro, em homens imperfeitos e depois em
homens indesejáveis.
A insistência
nas qualidades socialmente valiosas da personalidade, com exclusão de todas as
outras, derrota finalmente os seus próprios fins. O atual desassossego, descontentamento
e incerteza de propósitos testemunham a veracidade disto. Tentámos fazer homens
bons cidadãos de estados industriais altamente organizados: só conseguimos
produzir uma colheita de especialistas, cujo descontentamento em não serem
autorizados a ser homens completos faz deles cidadãos extremamente maus. Há
toda a razão para supor que o mundo se tornará ainda mais completamente
tecnicizado, ainda mais complicadamente arregimentado do que é presentemente;
que graus cada vez mais elevados de especialização serão requeridos dos homens
e mulheres individuais. O problema de reconciliar as reivindicações do homem e
do cidadão tornar-se-á cada vez mais agudo. A solução desse problema será uma
das principais tarefas da educação futura. Se irá ter êxito, e até mesmo se o
êxito é possível, somente o evento poderá decidir.
Aldous Huxley, in Sobre a Democracia e Outros Estudos
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