Fonte da imagem: Google
Há dois meses que Iracema recebia flores, sem
cartão. Colocava tudo nas jarras, vasos, copos; mesas, janelas, banheiro e até na
cozinha. Quando o marido lhe perguntava por que tantas flores, todos
os dias, ela sorria:
— Deixe de brincadeira, Epitácio.
Ele não percebia bem o que ela queria dizer, até
que um dia:
— Epitácio, acho bom você parar de comprar tanta
flor, já não tenho mais onde colocar.
Foi aí que ele compreendeu tudo:
— O quê? Você quer insinuar que não sabia que não
sou eu quem manda essas flores?
Foi o diabo, ela não sabia explicar quem mandava,
ele não conseguia convencê-la de que não era ele.
— Um de nós dois está mentindo — gritou, furioso.
— Então é você — rebateu ela.
No dia seguinte, de manhã, ele decidiu não sair,
pra desvendar o mistério. Assim que as flores chegassem, a pessoa que as
trouxesse seria interpelada. Mas não veio ninguém:
— Já são duas horas da tarde e as flores não
chegaram, Epitácio. É muita coincidência.
Vai me dizer que não era você.
Ele não tinha por onde escapar. Insinuou muito de
leve que a mulher devia ter conhecido alguém na sua ausência. Ela
chegou a chorar e se trancou no quarto. A discussão entrou pela noite até o
dia seguinte. Epitácio saiu cedo, sem mesmo tomar café. Bateu a porta com força
e levou o
mistério para o trabalho.
Meia hora depois, a mulher saiu e foi ao florista.
— Como vai, Dona Iracema? A senhora ontem não veio,
hein? Aconteceu alguma coisa?
À noite, Epitácio viu as flores e não disse uma
palavra, mas a mulher não parou:
— Seu cínico. Bastou você sair para as flores
aparecerem e ainda tem coragem de dizer que não foi você.
Nessa noite
ele teve insônia.
Leon Eliachar, in O homem ao zero
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