“O domínio de si próprio, embora eu não negue de
forma alguma a sua necessidade em muitas circunstâncias, não é a melhor forma
de conseguir que um ser humano se conduza bem. Tem o inconveniente de diminuir
a energia e as faculdades criadoras. É como uma pesada armadura que ao mesmo
tempo que impede o vosso braço de bater nos vossos vizinhos, o torna igualmente
incapaz de um movimento útil. Os que não têm outro apoio além da disciplina que
se impõem a si próprios, tornam-se obstinados e timoratos com receio de si
próprios.
Mas os impulsos aos quais eles não permitem
qualquer saída, continuam a existir neles a tal como os rios represados, cedo
ou tarde transbordarão. As forças a que nós contrariamos a função natural que é
o desabrochar da nossa própria vida, ou se atrofiam ou acabam por ter uma saída
perturbando a vida de outrem. Elas procurarão qualquer saída do gênero das que
não representam nenhum perigo para nós, por exemplo, a tirania doméstica. Se
essa saída não for suficiente, há outras que o podem ser. Há sempre condenados
e párias a quem a sociedade permite torturar e isso não comporta nenhum risco.
Esses párias,
tanto podem ser criminosos como escravos. Do ponto de vista da virtude
ultrajada, a lei penal tem o mérito de oferecer uma saída a esses impulsos
agressivos que a covardia, disfarçada em moralidade, refreia nas suas formas
mais espontâneas. A guerra tem a mesma vantagem. Vós não podeis matar o vosso
vizinho que detestais talvez cordialmente, mas um pouco de propaganda é
suficiente para transferir esse ódio a qualquer nação estrangeira, contra a
qual todos os vossos instintos assassinos se transformarão em heroísmo
patriótico.
Bertrand Russell, in A Última Oportunidade do Homem
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