domingo, 16 de junho de 2013

Muito mais do que 20 centavos

“Se engana quem acredita que a cidade parou por apenas 20 centavos. Embora 20 centavos faça a diferença para milhões.
Na manifestação do Movimento Passe Livre de terça-feira, a unanimidade foi chamar todo cidadão que protestou de vândalo e baderneiro.
As duas mais importantes autoridades da cidade estavam juntas em Paris, o governador do PSDB, Geraldo Alckmin, e o prefeito do PT, Fernando Haddad, com o vice-presidente da República, Michel Temer, do PMDB, numa surpreendente aliança com aspecto de grandeza e alucinada: sorridentes, esqueceram as divergências e tentaram vender mais uma vez o Brasil para outro grande evento internacional, enquanto as obras da Copa das Confederações não estão prontas, e as obras de mobilidade urbana para a Copa do Mundo nem começaram.
Na França, apresentaram o projeto de São Paulo à Expo 2020, uma prova de que o Poder vive num delírio megalomaníaco, ao passo que, quem leva duas horas por dia para ir trabalhar, três para voltar, em ônibus entupidos e caros, enfrenta 200 km de congestionamento, vive a realidade.
A manifestação nesses dias em São Paulo e outras capitais ganhou o caráter que deveria.
Não se trata apenas de centavos a menos na passagem do ônibus, mas de uma revolta coletiva contra um Estado que trata o indivíduo como um estorvo: o inimigo.
Estado que, ao invés de solucionar os problemas da violência, aterroriza. Que pensa para fora, não para dentro. Que gasta em estádios, não em metrô.
E mais uma vez, a Polícia Militar, o braço armado que garante o Poder aos incompetentes, e os blinda contra as revoltas, faz o trabalho que nem sequer o melhor dos marqueteiros conseguiria: une a sociedade, dentro e fora do Brasil, física e virtual, contra a violência de quem deve combatê-la e ganha para isso.
Viu-se uma PM tomar o Poder. Impedir que manifestantes ocupassem a avenida, ocupando-a. Abrir fogo contra inocentes e jornalistas. Tipificar uma manifestação política como formação de quadrilha.
Não é mais o aumento da passagem a bandeira. Alguns cartazes escritos à mão deram o tom.
“O povo não deve temer o governo, o governo deve temer o povo”.
“Uma cidade muda não muda”.
“Desculpe o transtorno, estamos mudando o País”.
Pela TV, assistimos a anarquia militar. Motos tocavam pedestres como gado em frente à FIESP. PMs atiravam a esmo. Encurralavam jovens de braços erguidos, rendidos.
Pelas redes sociais, minuto a minuto, informes, imagens e relatos.
Apresentadores de TV perdidos, desinformavam e confundiam.
Luiz Datena, da BAND, fazia uma enquete ao vive. Sua pergunta tendenciosa pedia uma resposta: “Você é a favor de protesto com baderna?” O resultado mostrou que a revolta é mais profunda, deixou o apresentador sem ação: o sim ganhava do não por 2050 a 851, quando a emissora tirou a enquete da tela. 
Enquanto pelas redes sociais rodava a foto da repórter Giuliana Vallone, da TV Folha, com o olho sangrando, de policiais quebrando o vidro da própria viatura para simular um ataque, de cinegrafista levando um jato de spray de pimenta, a polícia ocupava a Paulista, fechava a avenida para manifestantes não a ocuparem.
Antônio Prata tuitou: “No próximo protesto, que se combine de antemão. A PM vai pra praticar atos de vandalismo, e os manifestantes para tentar contê-los.”
Marcelo Rubens Paiva, in blogs.estadao.com.br, de 16/06/2013

4 comentários:

  1. Belo texto. êi, Rapadura Cult dê uma olhada no meu texto sobre isso lá do Blog do François Silvestre, no Portal no Ar. Quero sua opinião. Abraço.

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  2. Olá, Unknown. Procurei no blog de François, nas matérias dos últimos dias, e não consegui localizar o seu comentário, infelizmente. Indique-me, por favor, a matéria e o dia, que opinarei com prazer.
    Um abraço.

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  3. Porque é que quando a inflação era 300% ao ano e as favelas eram tomadas pelo tráfico de drogas internacional, esse povo maravilhoso não saia às ruas? Por que é que só agora esse povo acordou para a situação da saúde e da educação quando elas tem sido muito piores a mais de 10 anos atrás? Que tal o Facebook sendo usado pelas elites a fim de retomarem o governo nas próximas eleições, fazendo o povo de trouxa mais uma vez, depois que o país está sanado em suas contas e respeitado no exterior?
    Porque este povo não notou que a corrupção vem desde a década de 60, e também de muito antes, quando eu já nasci ouvindo isso, cresci, me formei, casei e tive filhos, que infelizmente cresceram fora do Brasil porque eu não aguentava mais lá pelo final dos anos 90? Porque será que nestes 15 anos fora do Brasil passei a vê-lo fazer parte do noticiário internacional com supresa de todos, e passei a ouvir de meus amigos no Brasil que muitos projetos estavam sendo premiados no exterior, coisa confirmada pelos governos alemão e norte-americano recentemente aí, no próprio Brasil a duas semanas atrás? Por que será que tenho a sensação de que as elites finalmente resolveram atacar uma vez que nunca engoliram um presidente realmente representante do povo e uma sucessora mulher no governo? Por que será que tenho a sensação de que a oposição anda tão calada porque está festejando em suas mansões a imbecilidade desse povo tão facilmente enganado e controlado, o mesmo que reclama das cotas para negros de escola públicas nas universidades públicas onde eles adoram por seus filhos? Por que será que esse povo não diz claramente que a revolta não é contra os ônibus morosos mas sim porque os pobres estão comprando carros e atulhando as ruas de tráfego pesado? Por que será que só eu não reclamo ter que tomar o avião de ônibus porque as passarelas telescópicas não tinham como dar vazão a todo aquele povo que atulhava o aeroporto de São Paulo no ano passado, claramente viajando pela primeira vez? Eu saí do Brasil morrendo de vergonha de ser brasileiro. Meu orgulho retornou durante estes 15 anos, e agora a vergonha me bateu de novo como algo que eu esperava a tanto tempo e tinha certeza que ia acontecer. Vergonha de pertencer a esta classe média nojenta e analfabeta brasileira, que não enxerga nem um palmo adiante de seus narizes.
    Como é que a educação anda mal das pernas se meu filho que é embaixador da universidade dele no exterior recebeu 150 alunos brasileiros da escola pública com tudo pago pelo governo, e filhos de nossos amigos também estão no exterior com tudo pago e vindos da escola pública também?
    Como é que se reclama de 5 centavos de aumento em passagens de ônibus que custam 1 dólar americano quando nós pagamos 8 dólares aqui fora por ônibus que atrasam mais do que os brasileiros e num trânsito muito pior do que o de São Paulo, vivendo neste paraíso de primeiro mundo maravilhoso?
    Será que estou ficando doido?
    Desculpe, anônimo para não levar pedradas.

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  4. Olá, anônimo. Compartilho, em parte, com seu ponto de vista. Muitos setores já melhoram neste país nos últimos doze anos. Porém falta muito ainda para nos orgulharmos como Nação. Vivemos um terrível paradxo: somos a 7ª economia do mundo e estamos na 85ª posição no ranking mundial de Índice de Desenvolvimento Humano - IDH. Só essa realidade já diz tudo.
    Um abraço,
    Elilson Jo´se Batista

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