Em
Maceió, nos anos 1930, o escritor Graciliano Ramos, morto há 60 anos, era
decano de uma turma de jovens intelectuais da qual faziam parte o poeta Aloísio
Branco, o ilustrador Tomás Santa Rosa e o filólogo Aurélio Buarque de Holanda.
Por este motivo, ganhou o apelido jocoso de "o velho Graça".
Quando
mudou-se para o Rio, passou a frequentar a livraria José Olympio e conheceu a
nata da intelectualidade na então capital.
Mais tarde
filiou-se ao Partido Comunista, chegando a se candidatar a deputado federal.
Esta trajetória não impediu que Graciliano, homenageado da Flip deste ano,
mantivesse fama de homem fechado, tímido e de raros amigos.
Sob
o olhar de Graciliano Ramos (sentado), Luís Carlos Prestes (dir.) entrega a
Cândido Portinari ficha de filiação ao PCB, nos anos 1940 – Acervo Projeto
Portinari
Folclore
que ele próprio alimentava com sua intolerância a intimidades gratuitas ou a
gestos derramados. Esta imagem é colocada em cheque na recente pesquisa que
reuniu a correspondência do escritor.
De 1909 a 1952,
ele recebeu ou enviou cartas para 106 correspondentes, número que surpreende e
contradiz sua fama de casmurro. Nelas, surge um Graciliano amigo, cordial,
interessado pelos problemas literários e políticos do seu tempo, e sempre
irônico e afiado em suas críticas.
O levantamento
foi feito pela pesquisadora da USP Ieda Lebensztayn, com orientação de Marcos
Antonio de Moraes, e será publicado em livro este ano. Foram localizadas 160
cartas inéditas, entre a correspondência ativa e passiva.
Sua rede de
contatos engloba desde figuras da extrema direita como o católico Alceu Amoroso
Lima a gente de extrema esquerda como o líder comunista Luís Carlos Prestes.
Entre os interlocutores também estão Jorge Amado, José Lins do Rego, Cândido
Portinari, Nelson Werneck Sodré e Cyro dos Anjos.
"Diziam que
ele era um homem isolado e seco, mas estas cartas mostram o contrário",
diz Lebensztayn.
A primeira
reunião da correspondência de Graciliano Ramos foi publicada em 1980. O livro
trazia cartas envidas a familiares e a um único amigo, Joaquim Pinto da Mota
Lima. Nelas transparecia um escritor apaixonado pela esposa e devoto da
família.
Mas a reserva e o
isolamento social continuavam sendo uma característica marcante, como comentou
o poeta
Lêdo Ivo sobre
aquela coletânea: "Os elementos básicos da sua personalidade - o
individualismo cerrado, o pessimismo visceral, o ensimesmamento, um sentimento
de desvalor pessoal que tende à autodestruição - se destacam sempre nestes
contatos".
A correspondência
agora reunida traz informações muitas vezes fragmentárias, mas ajuda a
relativizar cada um destes traços.
Marcelo Bortoloti, in
www.folha.uol.com.br
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