quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Sal da Palavra


A luz é para todos; as escuridões é que são apartadas e diversas”.
Guimarães Rosa

 

Prólogo                           A brochura do livro
Não está no meio;
Sim, na mente.

Renitência                      Às vezes o peixe
Nos escapa à mão.
Daí a relutância, persistência
Necessária.

Quem acendeu
os fachos das estrelas?

O menino.
Um menino equilibrista
Numa mangueira,
Bom de se ver.
Frutos colhidos,
Sugados até os ossos.

Esse amarelo-ouro
Não é de se pegar?

Divagações                     A fala, eis o que sou,
O meu discurso.
A palavra, dita ou não,
Vale. A palavra vã
Também.

As palavras do pai, mãe:
“Não te falei?”, machuca.

O compulsório
Da vida
É o fôlego.
Há palavras insossas,
Temperá-las é preciso.
O sal da palavra
Dá sabor ao dito.

Na ponta
Da língua
Sinto o condimento
Da palavra.

Reminiscências              O rio e seus reveses –
Seco é o rio
Da minha infância.
Margem esquerda,
Morada, 171,
Dita rua de Baixo
Oficial, D. Pedro II.
Viva a anarquia
Dos guris. Idos tempos.

                                        Chico Doido: olhos verdes
Atentos, pernas
Separadas, mãos ágeis
Nos revólveres imaginários.
Duelos inesquecíveis.
Nosso Django. Passarim
Grande. Um sopro
O matou. Do coração.

Os responsos
De minha tia
Não trouxeram de volta
Os meus pertences
Espirituais.

A fé, esta,
Onde está?

Dualidade                      De que é feita
A paixão
- Cegueira tresloucada -
Não nos foi dito.

O amor, colóquio,
Não se mede.

Interregno                      Mire:
O coqueiro, afeito ao solo,
Buscando o céu.

No mais, são insanas
Verdades
Ou mentiras ditas veras.
É possível navegar
No fio da faca.

Fiar-me de quê?
Os deuses são factíveis.

O ideário do rio
                                        É o mar. O do
Carrasco é a dor.

Repare:
De onde vem tamanho
Sabor das bagas
Da graviola?

O graveto flui,
Reflui no redemoinho
E é sorvido pela água.
Ele somos nós.

É forçoso dizer:
Os últimos serão
Os derradeiros. Quem
Espera sempre
Cansa.
                                   
Peroração                      “Vá buscar a coisa
                                         Que está em cima
Daquele negócio, menino.
Vai logo, diacho!”.

Sim, meu falar
Já foi antes dito,
Anotado, bisado, escrito,
Recontado, reproduzido,
E poderá ser dito,
Anotado, bisado...

Dizer a verdade
Dói mais que mentir.

Um rio é inconsútil:
Serpenteia nossos sonhos,
Impregna
Nossa secura.

                                        É com dissabor
Que recebemos a dor.
Mas o bem da casca
De angico trava.
Daí a alternância
Bem mal bem mal bem mal.

Telúrico                          O chão de minha terra
É de pedregulho só.
Será que fomos
Feitos desse barro?
Nuvens de pó
E de garranchos.
Oitos meses abióticos,
sinistros.

Eu, pouco, meus
Erros a mais.

Tentâmen                       Introspecto sou:
Logo, especulo,
Filosofo. Daí
Minha melancolia.

                                         O acúmulo
Do vil metal
É o cúmulo.

Ao reprovar
O autoritarismo
Da extrema direita,
Renego o da
Esquerda.

Elilson José Batista, in Inéditos & Afins

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