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Quer dizer que eu finalmente vou conhecer a famosa Samanta... ― disse Gustavo.
― Você vai amar a Samanta, Gu! ― disse
Suzaninha.
Suzaninha não parara de sorrir desde que recebera o
telefonema da irmã dizendo que chegaria no
dia seguinte e ficaria com eles. Samanta não era apenas sua irmã mais velha.
Era o seu ídolo. Gustavo já cansara de ouvir as histórias da Samanta que
Suzaninha contava com os olhos brilhando. Samanta fumando na mesa para desafiar
o pai, e apagando o cigarro no pudim para escandalizar a mãe. Samanta namorando
três ao mesmo tempo e tratando os namorados como empregados ("Homem só
serve para carregar peso" era uma das suas frases). Samanta não apenas
aderindo a todas as causas nobres como assumindo a liderança do
movimento. Samanta mandando em todos à sua volta, e sempre conseguindo o que
queria. Samanta brilhante. Samanta fantástica.
Samanta irresistível.
Gustavo não estava em casa quando Samanta chegou.
Suzaninha abraçou a irmã, emocionada, mas Samanta a afastou, examinou seu rosto
e sua roupa e decretou:
― Você está péssima.
― Você está linda!
― Esse seu marido não cuida de você, não?
― Cuida. Ele é formidável. Você vai ver.
E depois:
― Você vai amar o Gustavo, Sam!
Samanta dormiria numa cama de armar na salinha do
computador do Gustavo, que desocupara uma das suas estantes para a cunhada pôr
suas coisas. Depois de examinar todo o apartamento com uma leve expressão de
nojo ("Pequeno, não é?"), Samanta se atirara numa poltrona, aceitara
uma bebida ("Coca daiti com uma rodela de limão e pouco gelo") e passara
a fazer um relatório de casa, onde, para resumir, continuava tudo a mesma
merda, inclusive o pai e a mãe.
A novidade era ela. Samanta tinha um plano.
― Suzeca, decidi ter um filho.
― O quê?!
― Um filho. Você sabe, aquelas coisas que saem de
dentro da gente e fazem barulho.
― Mas assim, sem mais nem menos? Suzana queria
dizer "sem casamento nem marido?” – Sem mais nem menos, não. Será uma
coisa bem planejada. Para começar, preciso encontrar o homem ideal. É para isso
que estou aqui.
― Não era você que dizia que homem só serve para
carregar peso? ― E segurar a porta. Era.
Mas reavaliei meus conceitos. Também servem como reprodutores, até que inventem
coisa melhor.
Segundo Samanta, só os mortos nunca mudavam de
filosofia.
Samanta pôs-se a descrever o homem que procurava. O
físico. O temperamento. O jeito de ser. O posicionamento político ("De
esquerda, mas não muito"). E quanto mais Samanta falava, mais Suzaninha
tentava controlar o pensamento que a assolava, o vazio no seu estômago que aumentava,
a certeza que crescia. Mas não havia como evitar a conclusão aterradora:
Samanta procurava um homem como Gustavo. E Samanta sempre conseguia o que
queria.
Quando finalmente Samanta disse "Mas chega de
falar de mim, me conte sobre você, Suzeca. Você sente muito a minha
falta?" Suzana tinha decidido o que fazer. E quando Samanta comentou que Gustavo estava custando a
chegar, que não podia esperar para conhecer o famoso Gustavo, disse:
― Eu me esqueci. Hoje ele tinha médico.
― Médico? Algum problema?
― Nada demais. Quer dizer, é chato mas...
― Suzeca. Não me diz que...
Suzaninha fez que "sim" com a cabeça.
Sim, era o que Samanta estava pensando.
― Disfunção erétil ― Suzeca! Mas hoje existem esses
remédios...
― Nada funciona com o Gustavo.
Quando Gustavo chegou, deu com as duas irmãs
abraçadas no sofá, Samanta acariciando a cabeça de Suzaninha e dizendo:
― Suzeca, Suzeca...
Durante o jantar, Suzaninha viu Samanta examinando
Gustavo e pensou: "Ela deve estar
pensando ele é tudo que eu queria, mas não serve, maldição, não serve, pobre da
Suzaninha." E Samanta, examinando Gustavo, pensou "Hmmm, essa
disfunção erétil eu curo, ah se não curo". Pois Samanta não apenas
descobrira o reprodutor que queria, também descobrira outra causa nobre.
Suzaninha ainda a agradeceria.
Luís
Fernando Veríssimo
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