quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Fábulas fabulosas, de Millôr Fernandes

O nascer do Capitalismo

Um homem tinha uma fazenda perto de um rio. Certo dia o rio começou a subir e ele percebeu que sua fazenda ia ficar submersa. Transferiu toda sua família e todo seu gado e todos seus utensílios e móveis para o alto da montanha mais próxima. Havia, na sua fazenda, exatamente 284 quilômetros de cerca de arame farpado. Era um arame de sete farpas por metro, num total de sete mil farpas por quilômetro e, portanto, toda cerca somava 1.988.000 farpas. O homem arranjou um empregado, que, sem comer nem dormir, colocou em cada uma dessas farpas um pedacinho de carne, uma isca qualquer. Quando terminou, mal teve tempo de subir a montanha. Veio o dilúvio.
Durante noventa e três horas choveu ininterruptamente. Durante noventa e seis horas o rio esteve três metros acima da cerca. Mas logo as águas cederam, e rapidamente o rio voltou ao normal. O homem desceu e examinou a cerca. Encontrou, maravilhado, um peixe pendente de cada farpa, exceto três. Ou seja, um total de 1.987.997 peixes. Havia tainhas, e havia robalos, corvinas, namorados, galos e muitas outras espécies que ele nunca vira.
Cada peixe pesava, em média, duzentas e cinquenta gramas, de modo que o homem tinha um total de 496.099.250 gramas de peixe fresco, ou seja, 496.999 quilos de peixe. Isso tudo, vendido a 200 reais o quilo, vocês façam a conta e...
Ah, naturalmente o empregado foi despedido porque colocou mal as iscas nas três farpas que falharam.

MORAL: O OPERARIADO DEVE TER O MÁXIMO CUIDADO COM AS ISCAS DO CAPITALISMO.

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