Este poema é dedicado a um americano
simpático, extrovertido e podre de rico, em cuja casa estive poucos
dias antes de minha volta ao Brasil, depois de cinco anos de Los
Angeles, EUA. Mr. Buster não podia compreender como é que eu, tendo
ainda o direito de permanecer mais um ano na Califórnia, preferia,
com grande prejuízo financeiro, voltar para a "Latin America",
como dizia ele. Eis aqui a explicação, que Mr. Buster certamente
não receberá, a não ser que esteja morto e esse negócio de
espiritismo funcione.
Olhe aqui, Mr. Buster: está muito
certo
Que o Sr. tenha um apartamento em Park
Avenue e uma casa em Beverly Hills.
Está muito certo que em seu
apartamento de Park Avenue
O Sr. tenha um caco de friso do
Partenon, e no quintal de sua casa em Hollywood
Um poço de petróleo trabalhando de
dia para lhe dar dinheiro e de noite para lhe dar insônia
Está muito certo que em ambas as
residências
O Sr. tenha geladeiras gigantescas
capazes de conservar o seu preconceito racial
Por muitos anos a vir, e
vacuum-cleaners com mais chupo
Que um beijo de Marilyn Monroe, e
máquinas de lavar
Capazes de apagar a mancha de seu
desgosto de ter posto tanto dinheiroem vão na guerra da Coréia.
Está certo que em sua mesa as
torradas saltem nervosamente de torradeiras automáticas
E suas portas se abram com célula
fotelétrica. Está muito certo
Que o Sr. tenha cinema em casa para os
meninos verem filmes de mocinho
Isto sem falar nos quatro aparelhos de
televisão e na fabulosa hi-fi
Com alto-falantes espalhados por todos
os andares, inclusive nos banheiros.
Está muito certo que a Sra. Buster
seja citada uma vez por mês por Elsa Maxwell
E tenha dois psiquiatras: um em Nova
York, outro em Los Angeles, para as duas “estações” do ano.
Está tudo muito certo, Mr. Buster –
o Sr. ainda acabará governador do seu estado
E sem dúvida presidente de muitas
companhias de petróleo, aço e consciências enlatadas.
Mas me diga uma coisa, Mr. Buster
Me diga sinceramente uma coisa, Mr.
Buster:
O Sr. sabe lá o que é um choro de
Pixinguinha?
O Sr. sabe lá o que é ter uma
jabuticabeira no quintal?
O Sr. sabe lá o que é torcer pelo
Botafogo?
Vinicius de Moraes, em Para viver um grande amor
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