Poucos
ficam indiferentes quando numa cerimônia religiosa o padre pergunta:
“Promete ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença,
amando e respeitando até que a morte os separe?”
Os
homens se entreolham. Será que consegue?
As
mulheres torcem.
As
céticas abaixam a cabeça.
Parentes
das duas famílias miram o altar, encaram os noivos, esperam a
resposta zelando pelo seu.
Já
houve caso de pessoas que tiveram ataque de risos diante do padre. No
entanto, não se sabe se algum noivo pediu: “Defina ser fiel.”
E
se a noiva respondeu: “Cala a boca, seu canalha, você sabe muito
bem do que ele está falando.”
Ou
se houve a réplica: “Tudo bem. Ser fiel na alegria e na tristeza.
E no tédio, o que fazer?”
E
a tréplica: “Esqueci de contar, amor, sabia que papai me deu de
presente um AK-47 e farta munição, que ele ganhou graças a
serviços prestados para as FARC?”
Há
muito se discute se é possível manter um casamento seguindo os
preceitos (ou a utopia) da fidelidade. Homens e mulheres se dizem
incapazes de seguir o sermão à risca. Cada parte encontra
justificativas darwinistas.
Dizem
eles: a seleção natural contesta a fidelidade, já que o macho
precisa espalhar seu sêmen pelo maior número de fêmeas, para
garantir na reprodução a sobrevivência da espécie.
Dizem
elas: a fêmea fica na moita, observa o comportamento dos machos e
escolhe aquele mais forte, para aprimorar o gene do grupo, e se
aparece outro mais forte, viril e galã da novela, ela tem que mudar
de parceiro.
Bem,
você está cansado de ouvir este papo furado. Mas foi no início da
revolução sexual que se começou a elaborar os princípios do
casamento aberto. Aquele em que não é preciso pular a cerca, basta
atravessá-la calmamente, já que está escancarada.
A
ideia foi amadurecendo, muitas verdades do casamento passaram a ser
questionadas e novas fórmulas apresentadas, como as casas de swing e
o ménage à trois.
Aponte
uma mulher que não ouviu do marido após o ato: “Não me leve a
mal, eu te amo, você é linda, mas… E se você chamar uma
amiguinha para nos assistir? Nem vou encostar nela. Juro. Só para
apimentar a nossa relação…”
O
casal de filósofos franceses, Sartre e Simone de Beauvoir, é
reconhecido como o primeiro a propagar que não havia trancas nem
fechaduras nem arames no seu matrimônio.
Bem,
alguns acreditam que Simone descobriu só depois do porre e do sim
que Sartre não era exatamente um modelo de exuberância física,
além de caolho, e teria proposto a novidade.
Outros
afirmam que eles precisavam de estímulos externos, já que o sexo
entre dois existencialistas nunca se completa. Um costuma parar no
meio do ato e perguntar: “Mas se a essência vem antes da
existência, nós não existimos, e nada faz sentido?” E ficam
aterrorizados pela dúvida até alguém pegar no sono.
Imagine
que um casal consiga enfim chegar a um consenso e estabelecer uma
rotina madura em um saudável e bem resolvido casamento aberto. O
diálogo entre eles causaria estranheza para quem vê de fora. Mas
não internamente:
“Gato,
vou jantar com o Mário. Sem piadinhas.”
“De
novo?”
“Não.
Será a primeira vez.”
“Na
semana passada, você jantou com Mário, até dormiu com ele.”
“Aquele
foi o Rômulo.”
“Que
Rômulo, eu conheço?”
“Você
ficou com a mulher dele no nosso réveillon da Costa do
Sauípe.”
“Belas
costas… Antes ou depois da meia-noite?”
“Antes.
Depois você ficou comigo.”
“É
mesmo… Que farra. Rasguei o seu vestido a dentadas.”
“Não,
deve ter sido com a mulher do Rômulo.”
“Tem
certeza?”
“Eu
já estava pelada, não se lembra?”
“Por
quê?”
“Porque
vi os fogos no mar com o Arnaldo.”
“Arnaldo?”
“Cuja
mulher você papou no Carnaval de Porto de Galinhas.”
“Galinha…
Claro, como era o nome dela?”
“Você
acha que eu devo ir pra cama hoje?”
“Com
quem?”
“Com
o Mário. Sem piadas. É nosso primeiro encontro. Se eu ficar com ele
já no primeiro encontro, ele pode me achar uma vadia. Tem homem que
gosta de charminho.”
“Se
ele te chamar de vadia, eu processo ele.”
“Fico
ou não fico?”
“Fica
logo. A vida é uma só.”
“Estou
gata?”
“Está
linda.”
“Ele
vai me achar atraente?”
“Se
não achar, liga para o Rômulo.”
“Mas
a calcinha está marcando?”
“Está
uma delícia.”
“Com
lenço ou sem?”
“Sem.”
“Com
sutiã ou sem?”
“Sem.”
“Com
batom ou sem?”
“Amor…”
“Que
foi?”
“Sei
lá, está me dando uma coisa agora…”
“Ciúme?!
Ah, gato, nem vem! A gente combinou.”
“Não,
isso não. É que você está tão linda sem batom, sutiã, lenço,
com a calcinha marcando que…”
“Que…?”
“Que
me deu uma vontade de… Nada não. Vai jantar com o Mário. Melhor
dar logo. Tem também os caras que detestam mulheres enroladas.”
“Tem
certeza? Se quiser…”
“Precisamos
disso para manter a chama do nosso casamento.”
“Te
amo tanto…”
“Olha,
você já estava esquecendo a camisinha.”
Marcelo Rubens Paiva, em As verdades que ela não diz
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