O
alcaide e o galã
– Não
dorme sozinha – diz alguém. – Dorme com esse aí.
E
o apontam. O preferido da moça é um soldado de boa postura e com
mel nos olhos e na voz. Dom Diego mastiga o despeito e resolve
esperar.
A
oportunidade chega uma noite, em uma das casas de jogo de Potosí,
vinda na mão de um frade que tinha jogado o dinheiro das esmolas. Um
mago dos baralhos está recolhendo os frutos de seu ofício quando o
padre depenado deixa cair um braço, tira um punhal da batina e crava
a mão dele no tapete. O galã, que anda por ali por pura
curiosidade, se mete na briga.
Vão
todos presos.
Toca
ao alcaide, dom Diego, decidir. Encara o galã e oferece:
– Multa
ou chibata.
– Multa,
não posso pagar. Sou pobre, mas fidalgo de sangue puro e solar
conhecido.
– Doze
chibatadas para este príncipe – decide o alcaide.
– A
um fidalgo espanhol! protesta o soldado.
– Conte-me
isso pela outra orelha, porque esta não te crê – diz dom Diego e
senta-se para desfrutar as chibatadas.
Quando
o desamarram, o castigado amante ameaça:
– Em
vossas orelhas, senhor alcaide, cobrarei vingança. As empresto a vós
por um ano. Podeis usá-las por um ano, mas são minhas.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
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