segunda-feira, 11 de novembro de 2024

O quarto duplo


Um quarto que parece fruto de um devaneio, um quarto realmente espiritual, no qual a atmosfera estagnada se pinta de suaves tons de rosa e azul.
A alma aí toma um banho de preguiça, aromatizada pelo arrependimento e o desejo. É qualquer coisa de crepuscular, de azulado e de rosáceo; um sonho voluptuoso durante um eclipse.
Os móveis têm formas alongadas, prostradas, lânguidas. Os móveis dão a impressão de sonhar; dir-se-ia que são dotados de uma vida sonambúlica, como o vegetal e o mineral. As almofadas falam um idioma mudo, assim como as flores, assim como os céus, assim como os sóis que se põem.
Nas paredes, nenhuma abominação artística. Comparada ao sonho em estado puro, à impressão não analisada, a arte definida, a arte positiva é uma blasfêmia. Aqui, tudo tem a clareza suficiente da harmonia e sua deliciosa obscuridade.
Uma fragrância infinitesimal da escolha mais sofisticada, à qual se mistura uma muito sutil umidade, flutua nessa atmosfera onde o espírito, dormente, é embalado por sensações de estufa aquecida.
A musseline cai em abundância diante das janelas e diante da cama; ela se expande como uma espumosa cascata. Sobre o leito está deitado o Ídolo, a soberana dos sonhos. Mas como veio parar aqui? Quem a trouxe? Que poder mágico a instalou nesse trono de devaneio e de luxúria? Mas o que importa? Está aqui, e a reconheço!
Eis inconfundíveis seus olhos cuja chama atravessa o crepúsculo; sutis e terríveis espelhos cuja assustadora malícia reconheço! Eles atraem, eles subjugam, eles devoram o olhar do imprudente que os contempla. Muitas vezes os estudei, admirado e curioso como diante de um sol negro.
A que demônio bem-intencionado devo essa atmosfera envolvente de mistério, de paz e de perfumes? Oh beatitude! Aquilo que costumamos chamar de vida, mesmo nos momentos mais felizes de expansão, não tem nada de comum com essa vida suprema que agora experimento e saboreio a cada minuto, a cada segundo!
Não! Que minutos, que segundos? O tempo desapareceu; é a Eternidade que reina, uma eternidade de delícias!
Mas uma batida terrível, pesada, fez estremecer a porta e, como em um pesadelo infernal, senti ter levado uma agulhada na boca do estômago.
E em seguida um Espectro entrou. Um funcionário que vem me torturar em nome da lei; uma concubina infame que vem chorar misérias e acrescentar as trivialidades da sua vida às dores da minha; ou ainda o faz-tudo enviado pelo diretor do jornal a exigir a entrega do manuscrito.
O quarto paradisíaco, o ídolo, a soberana dos sonhos, a Sílfide, como dizia o grande René, toda essa magia desapareceu com a batida brutal do Espectro.
Que horror! Agora lembro, lembro! Sim! Esse pardieiro, residência do tédio eterno, é bem o meu. Aí está a mobília vulgar, coberta de pó, lascada; a lareira sem chama e sem brasa, imunda de escarros: as melancólicas janelas em que a chuva cavou sulcos na poeira; os manuscritos, riscados ou incompletos; o calendário onde o lápis ressaltou as datas fatídicas!
E esse perfume de outro mundo, no qual eu me embriagava com uma refinada sensibilidade, ai de mim! Foi substituído pelo cheiro fedorento de tabaco misturado a sabe-se lá que tipo de mofo. Respira-se já aqui o ranço da desolação.
Nesse mundinho pequeno, mas farto de desgosto, só um objeto conhecido me sorri: a garrafinha de láudano; velha e espantosa amiga; como todas as amigas, aliás! Fértil em carícias e traições.
Ah, sim! O Tempo está de volta, o Tempo reina agora soberano; e junto com o velho repugnante retornou o seu cortejo demoníaco de Lembranças, de Arrependimentos, de Espasmos, de Medos, de Angústias, de Pesadelos, de Cóleras, de Neuroses.
Eu lhes asseguro que todos os segundos são agora forte e solenemente acentuados, e cada um deles, brotando do pêndulo, diz:
Sou a Vida, insuportável, implacável!
Não há senão um segundo na vida humana cuja missão é anunciar uma boa nova, a boa nova que faz eclodir em todos esse medo inexplicável.
Sim! Reina o Tempo, em sua brutal ditadura. Ele me conduz, como se um boi eu fosse, com seu duplo aguilhão:
Anda! Puxa, burrico! Força, escravo! Vai, maldito!

Charles Baudelaire, em O spleen de Paris – Pequenos poemas em prosa

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