Meu
pai sempre dizia, quando for escolher uma mulher, escolha uma que
saiba lavar, passar e cozinhar. Ele tinha oitenta anos, era muito
sabido. Minha mãe morreu quando eu tinha quinze anos. Lembro-me
dela, sempre no tanque, ou passando roupa, ou na cozinha,
bem-disposta, gorda e corada. Morreu dormindo. Não demorou para o
velho botar outra mulher dentro de casa, o velho aos oitenta anos
ainda dava no couro. E depois outra, e quando entrava uma nova ele me
perguntava, referindo-se à anterior, aquela vaca cozinhava mal, não
cozinhava? Ou então, viu como a vadia passava a roupa mal?
Morávamos
no mesmo morro, mas em casas diferentes. Ele comprou para mim a casa
onde moro, que tem quarto, sala, banheiro, cozinha e uma laje onde
fica o tanque de lavar e onde posso apanhar sol, se quiser.
Sempre
que eu levava uma mulher para casa, quando estava na cama eu
perguntava, depois de foder, você sabe lavar, passar e cozinhar? A
resposta era sempre a mesma, sabia. Então eu dizia, quero ver, e
levava a dona para a laje onde ficava o tanque, sempre cheio de
roupas sujas, e dizia, lava para eu ver.
A
dona ia para a laje, lavava e dependurava a roupa na corda. Depois eu
dava outra trepada nela e já era hora do almoço e eu dizia, agora
você vai cozinhar para mim. Ela fazia o almoço. Se a roupa tivesse
sido mal lavada e a comida estivesse uma merda, a vadia levava logo
um pé na bunda.
Às
vezes a comida era boa e a lavagem de roupa, uma droga, ou
vice-versa, e isso criava um problema e eu consultava o velho. Ele
respondia, a dona tem que saber fazer as duas coisas. De que adianta
ela só saber cozinhar? Você vai andar por aí todo imundo e
amassado? E se ela só souber lavar e cuidar da roupa, você vai
passar fome? A tua mãe te acostumou a comer papa-fina. A vadia tem
que saber as duas coisas.
Todas
diziam que sabiam lavar, passar e cozinhar, mas era sempre um truque
para pegar o otário. Elas queriam era mudar para a minha casa, de
onde se podia ir a pé para o Leblon, e além do mais, modéstia à
parte, eu era bom de cama, devia ser coisa de família, o velho
estava lá para comprovar.
Por
que as mulheres de hoje só sabiam fazer uma coisa, nunca eram
completas, como a minha mãe? Acho que é porque elas viam televisão
demais, lavar roupa, na televisão, era sempre tarefa de preta
fodida, cozinhar a mesma coisa.
Eu
andava paquerando uma dona chamada Guiomar, ela fazia o maior
cu-doce, dava beijinhos mas não deixava eu pegar nos seus peitos nem
passar a mão na sua bunda. Só que ela era tão gostosa que eu me
enchi de paciência e entrei no jogo dela, sabia que aos poucos ia
conseguir o que queria. Primeiro ela deixou eu pegar nos peitinhos,
depois lamber os biquinhos, depois passar o dedo no grelinho. Mas
isso demorou um tempo enorme.
Afinal,
depois de seis meses consegui levá-la para a minha casa, para a
cama. Antes de fodermos Guiomar me disse que só tivera até então
um homem em sua vida, mas que ele não era boa bisca e ela se livrara
do sujeito. Disse ainda que confiava em mim, que eu era uma boa
pessoa, honesto e trabalhador. Isso eu era mesmo, trabalhava de
porteiro no mesmo prédio havia mais de três anos e todos os
moradores gostavam de mim.
Nunca
pensei que foder fosse uma coisa tão boa. Se quisesse contar como
foi a minha trepada com Guiomar, eu tinha que ser um escritor
daqueles que escrevem livros grossos cheios de páginas. O que eu sei
é que depois de fodermos não sei quantas vezes eu fiquei deitado na
cama, ela com a cabeça em cima do meu peito, feliz como nunca.
Então
me lembrei de perguntar se ela sabia lavar, passar e cozinhar. Não
sei, meu amor, ela respondeu, trabalho de caixa no supermercado,
almoço no trabalho e quando chego em casa janto sopa dessas de
envelope que você põe numa xícara grande, joga água fervendo,
mexe e pronto, é só comer. Você já tomou essa sopa? É baratinho,
no meu supermercado tem de galinha, carne, dez legumes, ervilha com
pedacinhos de torrada, brócolis e uma porção de outras, eu gosto
da de galinha.
Eu
nunca tinha comido uma merda daquelas e duvido que o meu velho também
tivesse. Guiomar não sabia lavar, passar nem cozinhar e eu devia dar
um pé na bunda dela, mas não dei. Pensei, vou foder mais uma vez
depois boto para escanteio.
E
fodi mais uma, mais duas, mais três. Fodi o mês inteiro e mais
outro mês e não botei ela para corner. Eu estava apaixonado.
Perguntei se ela queria morar comigo. Ela queria. O morro onde
Guiomar morava era longe do Leblon, onde ficava o supermercado em que
ela trabalhava.
Guiomar
mudou para minha casa. Aprendi a cozinhar e a lavar. Guiomar entra às
nove horas no supermercado e eu, que sou porteiro da noite, fico em
casa, lavo a roupa e ponho para secar num varal na laje, cozinho e
deixo o jantar pronto.
Jantamos
juntos antes de eu ir trabalhar. Quando volto, Guiomar ainda está
dormindo e eu deito na cama e fodo ela ainda dormindo e ela acorda e
diz que me ama e eu digo que a amo e fodemos novamente.
Meu
pai não sabe nada disso. Se souber, ele me mata. Ontem o velho
disse, qualquer domingo desses vou almoçar na sua casa com a minha
dona. Puta merda, como vou sair dessa? Não quero matar o velho de
desgosto.
Rubem Fonseca, em Ela e Outras Mulheres
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