16
Os
tumultos terminaram, o bebê se acalmou, e descobri alguns truques
para escapar de Janko. Mas as tonturas persistiam. O médico me
receitou umas cápsulas tranquilizantes e elas ajudaram um pouco.
Certa
noite, me levantei para tomar um gole d’água. Depois retornei,
trabalhei meia hora e fui para meu descanso de dez minutos.
Quando
voltei a me sentar, Chambers, o supervisor, um loiro alto, veio
correndo:
— Chinaski!
Finalmente você cavou sua sepultura. Esteve fora por quarenta
minutos!
Em
outra noite, tempos atrás, Chambers tinha caído no chão, num
surto, espumando e se contorcendo. Levaram-no de maca. Na noite
seguinte a essa, ele voltou, de gravata, camisa nova, como se nada
tivesse acontecido. Agora vinha com essa conversa para boi dormir
para cima de mim.
— Veja
bem, Chambers, seja compreensivo. Tomei um gole de água, me sentei,
trabalhei trinta minutos, depois saí para o intervalo. Fiquei lá
fora dez minutos.
— Você
cavou sua sepultura, Chinaski. Ficou lá fora durante quarenta
minutos! Tenho sete testemunhas!
— Sete
testemunhas?
— SIM,
sete!
— É
como eu disse, foram dez minutos.
— Não!
Dessa vez pegamos você, Chinaski! Pegamos com a boca na botija!
O
fato era que eu estava cansado daquilo. Não quis mais nem olhar para
ele:
— Tudo
bem, então. Fiquei lá fora por quarenta minutos. Faça o que bem
entender. Registre uma queixa.
Chambers
saiu correndo.
Carimbei
mais algumas cartas, então o supervisor-geral se aproximou. Um
sujeito magro e branco, com pequenos tufos de cabelos grisalhos
pendendo acima das orelhas. Olhei para ele e voltei e carimbar mais
algumas cartas.
— Sr.
Chinaski, estou certo de que o senhor conhece as regras e o
regulamento dos Correios. Cada funcionário tem direito a dois
descansos de dez minutos, um antes do almoço, outro depois do
almoço. O direito de descanso é garantido pelo acordo: dez minutos.
Dez minutos são...
— PORRA
DO CARALHO!
Joguei
minhas cartas no chão.
— Só
admiti que tinha sido um intervalo de quarenta minutos para
satisfazer vocês e para que me largassem de mão. Mas vocês não
conseguem dar uma folga! Agora retiro o que disse! Só fiquei lá
fora por dez minutos! Quero ver quem são suas sete testemunhas!
Traga-as já até aqui!
Dois
dias depois eu estava no hipódromo. Dei uma olhada ao redor e vi
todos esses dentes, esse enorme sorriso e uns olhos brilhando,
amigavelmente. Quem era — com todos aqueles dentes? Olhei mais de
perto. Era o Chambers olhando para mim, sorrindo e parado em uma fila
de café. Eu tinha uma cerveja na mão. Me aproximei de uma lata de
lixo e, sem tirar os olhos dele, cuspi tudo. Depois me afastei.
Chambers nunca mais voltou a me incomodar.
Charles Bukowski, em Cartas na Rua
Nenhum comentário:
Postar um comentário