A
primeira coisa que aconteceu depois da morte de meu pai foi a
tragédia de meu irmãozinho Marcelino. Uma noite, enquanto brincava
de esconde-esconde no beco, foi atropelado pelas rodas traseiras do
caminhão de lixo. Morreu na hora.
Como
chorei, grudada em sua cabecinha de livro!
Tempos
depois, meu irmão Mirto, que nunca tinha namorado, se engraçou com
uma viúva jovem que andava pela Mina de visita, uma viúva negra que
sorveu seus miolos de tal forma que ele não titubeou em ir com ela
para a cidade de Coyhaique. Mais de quatro mil quilômetros ao sul do
país!
Foi-se
embora sem avisar ninguém.
Ele
tinha dezesseis anos, a viúva tinha vinte e oito.
Depois,
um clube de futebol profissional que andava de excursão pelo norte
fez um jogo amistoso com o time da Mina.
Quando
viram meu irmão Manuel jogar, ficaram tão impressionados com seus
dribles e passes firulados que o levaram para a capital, para treinar
nas divisões inferiores.
Ele,
pelo menos, se despediu.
No
entanto, a coisa verdadeiramente triste – tão triste como a morte
de meu irmão Marcelino – foi o que aconteceu com Mariano, meu
irmão mais velho. Como já trabalhava na Companhia e ganhava um
salário de homem feito, se deu para a bebida. Do trabalho ia beber
com seus amigos. Certa noite, bêbado feito uma cabra, teve a infeliz
ideia de contar no balcão do bar, e a toda voz, que foi ele quem
matou o sacana do agiota. Dois dias depois os detetives do porto
vieram buscá-lo e ele foi levado preso.
Nunca
disse que tinha matado para vingar a sujeira que o homem havia feito
comigo. Só se limitou a dizer que foi para roubar dinheiro, e que
nos bolsos do avarento de merda só achou farelo de pão.
Para
fechar o quadro, naqueles mesmos dias chegou no povoado o primeiro
aparelho de televisão, artefato que, segundo previam todos, acabaria
de uma vez e para sempre com o cinema. A prisão de Mariano e a
chegada da televisão, coisas que aconteceram quase em uníssono,
definiram meu destino.
Com
a ausência de meu irmão eu ficava sem casa, e com o assunto da
televisão eu corria o perigo de ficar sem ofício.
Hernán Rivera Letelier, em A Contadora de Filmes
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