Para
Eneida Maria de Souza
No
Ponto, na farmácia de seu Belo, no armazém de secos e molhados de
seu Bernardino, mesmo no final das tardes de conversação distinta
do Banco Duas Pontes, no gabinete do nobre de alma e de gestos Vítor
Macedônio (o belo varão, bem-nascido e gentil-homem), que reunia em
torno de si (ali se servia do melhor conhaque francês) os potentados
do café como o coronel Tote ou ilustres desocupados como seu Bê P.
Lima, maledicente e boa-vida, mas de berço, enfim nas várias ágoras
da cidade onde se comerciava a novidade, a imaginação, o ócio e o
tédio... Nas janelas das casas terreiras de grandes e pesadas
janelas de marco rústico, baixo e retangular, junto das calçadas,
onde se ficava sabendo de tudo pelos passantes que iam e vinham (como
era bom se debruçar e bater dois dedinhos de prosa ou fugir para
dentro, se quem apontava na esquina era um maçante), de tudo se
sabia sem carecer de estafeta e selo, as notícias e novidades: quem
andava pastoreando quem, aquela que tinha caído na vida e agora era
carne nova, estava de rapariga na Casa da Ponte, na testa de quem
apontara o broto de futura e soberba galhada...
Mesmo
nas nobres sacadas de ferro, nas janelas de ricos sobrados, podia-se
ver a qualquer hora do dia, no enovelar lento do tempo, os carapinas
do nada, ocupados na gratuita e absurda, prazerosa ocupação. Eram
os carapinas do mínimo e do nada, os devoradores das horas,
insaciáveis Saturnos, dizia o sapientíssimo, alambicado, precioso
Dr. Viriato.
Quem
não tem o que fazer, faz colher de pau e enfeita o cabo, vinha por
sua vez o proverbial, memorioso, eterno, pantemporal noveleiro Donga
Novais, uma das poucas pessoas a não se entregar inteiramente ao
vício e paixão da cidade. É porque para ele a entidade metafísica
do tempo não existe (como para os platônicos que, ao contrário dos
hebreus, não tinham o senso da historicidade, lidavam com o puro
universal), passado, presente e futuro são uma coisa só, retrucava
o Dr. Viriato, súbito espantosamente aderindo à fiação e
tecelagem dos nossos mitos. Ele que era um cientista exaltado, um
agnóstico convicto, de dialético linguajar maneirista que demandava
precioso raciocínio, imaginação, dicionário.
Não
que o Dr. Viriato tivesse as mãos ocupadas no admirável passatempo
(santo remédio para a ansiedade e a angústia), que demandava
habilidade, precisão e paciência, a que se dedicavam
aristocraticamente potentados e pingantes que só tinham de seu serem
bem-nascidos. Tão alto crítico ele era, jamais se permitiria aquela
vamos dizer arte, paixão antiga de Duas Pontes. De uma certa maneira
ele colaborava era na criação de nossos mitos, mesmo negando-os,
racionalista que ele se dizia e era. Quando, quem inventou tão
sublime vamos dizer desocupação e alívio do espírito, perguntava
o Dr. Viriato a seu Donga Novais, sapiência viva do nosso tempo e
história, os fabulosos, inconclusos e aéreos anais. Você, Donga, é
o Sócrates da nossa pólis. Não sei, dizia desapontando à gente o
nosso macróbio cidadão Donga Novais: amor e ócio são maus
negócios. Eu acho que deve ser invenção de índio, que enfeitava
caprichosamente as suas flechas que, partidas do arco, não voltavam
mais. Mas eles não estão enfeitando nada, dizia por sua vez o Dr.
Viriato. Os puristas, os cultores do absoluto, os escribas da ideia,
dos protótipos e arquétipos ideais, os minúsculos carapinas do
nada.
Seu
Donga ficou um tempo parado, assuntando, ideando. Não é que o
senhor tem razão, Dr. Viriato? Sim, dizia o médico, porque a
finalidade mágica dos bisões e demais caças pintadas nas cavernas
pelo homem de Cro-Magnon... Seu Donga desatou a rir, não tinha mesmo
jeito aquele Dr. Viriato, comia brisas com pirão de areia.
Porque
havia três categorias de livres oficiais que se dedicavam à nobre
arte de desbastar e trabalhar a madeira com o simples canivete e um
ou outro instrumento auxiliar feito as latinhas que faziam as vezes
do compasso. Três, porque não se podia considerar como cultores da
Ideia, do sublime e do nada, os carpinteiros e marceneiros, que se
utilizavam da madeira e de instrumentos mais eficientes como o
formão, o cepilho, as brocas, e tudo sabiam de sua arte, ofício e
meio de vida. São os nossos sofistas, dizia o Dr. Viriato, que
pensavam ser possível ensinar a arete e recebiam pelo seu trabalho e
tinham as mãos calosas.
A
primeira categoria quase se podia, se não fosse o nenhum pagamento,
considerar uma corporação de operários, que faziam de sua técnica
e imaginação um ofício. Se vendiam o produto, não eram bem vistos
pelos autênticos carapinas do nada, os sublimes; podiam começar a
receber encomendas como qualquer trabalhador, o que se considerava
degradante. Não há dúvida que o elogio é uma forma sublimada de
remuneração e só se remunera operário, o que nem de longe se
podia dizer deles (se ofendiam) que nunca pegaram no pesado. Eles e
seus ancestrais, patriarcas absolutos, sempre estiveram do lado do
cabo do chicote.
Eram
os fabricantes de carrinhos de bois, caminhões, mobilinhas, monjolos
de sofisticada feitura e perfeita serventia, usados para compor
presépio. Em geral exerciam a sua ocupação ociosa em casa, se
serviam de instrumentos caseiros para auxiliar o trabalho do
canivete, e chegavam a utilizar outros materiais que não a madeira,
como espelhinhos, pregos, folhas-de-flandres.
A
segunda categoria, os marceneiros da nobre arte. Era exatamente
aquela, sem metáfora ou imagem, de que falou o sábio e intemporal
rifoneiro Donga Novais — os que literalmente enfeitavam o cabo de
colher de pau. As vezes se dava o caso de que a colher ficava tão
bem-feitinha e artística, com delicado e sutil rendilhado,
labiríntica barafunda, de quase absoluta nenhuma serventia, que a
peça passava de mão em mão por toda a parentela, vizinhos e mesmo
estranhos. Os elogios que recebiam valiam por uma paga ao artista,
que acabava por consentir (queriam) que a mulher ou a filha colocasse
a colher na parede, para nunca ser usada.
O
perigo dessa categoria era o autor, por vaidade ou outro motivo
subalterno, gravar o seu nome na concha ou no cabo da colher. Como o
primeiro artista da antiguidade que gravou numa obra sua a frase
“Felix fecit”, inaugurando assim o culto da personalidade, tão
contrário aos artistas do gótico, que nunca tinham a certeza de
verem concluídas as catedrais que iniciavam, e eram anônimos, senão
humílimos oficiais.
O
coronel Sigismundo era exemplo típico dos oficiais da segunda
categoria. Era não só meio destelhado e quarta-feira, mas
verdadeira alimária. Dele constavam dos anais fantásticas proezas
nos seus carros sempre novos e lustrosos, se dando ao luxo e à
extravagância de às vezes vestir a sua brilhosa e engalanada farda
da Guarda Nacional, que não mais existia, e passear de carro pela
cidade.
Tudo
se desculpava no coronel Sigismundo, por respeito ou medo. Ele se deu
ao máximo, como nos tempos de casa-grande e senzala, de oferecer não
uma colher de pau, mas palmatória de manopla por ele rendilhada,
verdadeiro instrumento de suplício, ao major Américo, diretor e
dono do Colégio Divino Espírito Santo, de terrível e acrescentada
memória, capaz de desasnar a própria alimária. O velho major da
Guarda Nacional recuou, os tempos agora eram outros. O gesto de
ofertar e a utilidade do produto desqualificavam muito o coronel
Sigismundo. Podia-se argumentar em seu favor que uma colher de pau
também é útil. Sim, mas ninguém ia usar uma colher de pau
finamente trabalhada para remexer panela, o bom dela, após o
trabalho do artista, era não servir para coisa nenhuma, puro
deleite. E agora se apresenta a pura, a sublime, a extraordinária
terceira categoria. Só aos seus membros, peripatética academia, se
podia aplicar estes qualificativos: divinos e luminosos,
aristocráticos artífices do absurdo. Eram como poetas puros,
narradores perfeitos, cepilhando e polindo as vazias estruturas do
nada. A terceira categoria era o último estágio para se atingir a
sabedoria e a salvação.
Às
vezes se dava o caso de que o artista (e isso não se ensina, ao
contrário do que afirmavam os sofistas, dizia o Dr. Viriato, emérito
teórico do vazio e do absoluto) vinha diretamente da primeira
categoria, e alcançava a plenitude do nada, era um dos amados dos
deuses, para os quais o grande, senão único pecado é a ignorância.
Não se atingia essa categoria (era raríssimo o caso de um jovem a
ela pertencer; falta à juventude ócio e paciência) senão na
velhice, quando se alcançava a plenitude da arete.
Vovô
Tomé era um desses casos raros do artista que passa veloz e
diretamente da primeira à terceira categoria. Atribuem a sua proeza
e a sua mestria no ofício ao sofrimento, que é uma das vias para se
atingir o absoluto e a glória. Ele os alcançou, e isso consta dos
anais do vento, na última velhice, quando atingiu, de apara em
apara, cada vez mais longas e mais finas, enroladinhas que nem cabelo
de preto, o etéreo, e o que lhe restou na mão foi um minúsculo
pedacinho de pau. Na mesa, a seu lado, no círculo de luz do cone do
abajur, um monte de finíssimas aparas, nenhuma delas partida. Uma
obra divina, foi o que disse o famigerado artista Bê P. Lima, quando
viu o tiquinho de nada que restou. Falou quem pode, disse seu Donga
Novais da sua aérea, fantástica e insone janela, almenara da
cidade. Um mestre e guru nirvântico, acolitou-o o Dr. Viriato.
Para
atingir esse estágio, o noviço carece de muita paciência,
aplicação, humildade, modéstia. É preciso enfrentar a
maledicência dos ocupados, vencer a delicadeza e timidez, correr o
risco de se ferir.
O
mais elevado ideal dos membros dessa categoria era se dedicar a tão
sublime ocupação sentado numa roda, prestando atenção no
desenrolar da conversa vadia e mesmo dela participando com um ou
outro aforismo ou ponderação, sem despregar os olhos da mecânica
ocupação. Conta-se a fantástica proeza de um dos sacerdotes do
culto, o inefável seu Bê P. Lima, que começou desbastando um
grande pedaço de madeira e foi indo, foi indo, de caracol em
caracol, sem pressa, preciso, cuidando do seu gratuito oficio, o
ouvido porém atento à conversa, que esquentava, e seu Bê não
queria perder nada, cujo tema principal era o comportamento de certa
dama de nossa cidade. E de repente se suspendeu a conversação,
todos voltados para ele. Seu Bê se aproximava do fim, faltava-lhe
uma última e mínima apara para atingir o nada. O próprio seu Belo
veio lá de dentro do laboratório e ficou à espera. Então
aconteceu. Não se podia dizer se o que ficou na mão de seu Bê
fosse ou não minúsculo caracol que ele soprou. Como num circo ou
num concerto, após sustenida atenção, a respiração suspensa, a
roda prorrompeu num coro de palmas.
Seu
Vítor Macedônio, que passava pela farmácia, diante do silêncio da
roda, parou. Não se dedicava ao nobre ofício, mas vendo a atenção
de todos, também ele aderiu à rodada de palmas. Seu Bê, me faça o
favor de comparecer no banco lá pelo fim da tarde, para comemorarmos
o evento. Mais do que o normal, ele seria generoso com o seu conhaque
francês.
Acredito
com os outros que o móvel inicial que levou o vovô Tomé à nobre
ocupação de pica-pau tenha sido o sofrimento. O suicídio de tio
Zózimo, a loucura mansa de tia Margarida, um desastre econômico de
papai que o obrigou a vender a Fazenda do Carapina para que não lhe
tomassem a casa. Mas muito antes da terrível morte de tio Zózimo
ele já se ocupava em fazer a canivete um ou outro objeto de alguma
serventia. A gratuidade mesmo de magníficos caracóis ele só viria
a atingir depois da morte por enforcamento de tio Zózimo.
Mas
antes mesmo do primeiro desses tristes acontecimentos vovô Tomé já
se dedicava a manter as mãos ocupadas. Acredito em parte que foi a
tentativa de manter as mãos ocupadas para vencer a opressão e a
angústia que o levou a se dedicar a pequenas tarefas caseiras.
Porque não lhe bastava fazer um longo, caprichado e lento cigarro de
palha, tarefa em que era perito. Os outros podem estar certos, e eu
mesmo recuaria no tempo (não conhecia senão de crônica vovô Zé
Mariano, pai de vovô Tomé), se pudesse contar a história que, num
dia de maior solidão e sufocamento, sob promessa de sigilo, me
contou vovô Tomé. Mas é um caso longo, não é para agora. Não,
não foi só isso. Havia um lado menino muito bom em vovô Tomé. Eu
me lembro do entusiasmo em que ele ficava quando da chegada de um
circo à nossa cidade, mesmo que fosse circo de tourada. E eu muito
criança ia com ele, ficava no seu camarote. Só depois é que eu o
abandonei para estar com os meus amigos mais velhos lá no alto das
arquibancadas. Me lembro (e isso mamãe e vovó Naninha confirmam)
dos primeiros passos de vovô Tomé na arte de picar pau. Eu estava
sentado no chão de tábuas lavadas e secas da sala, cortando figuras
de umas revistas velhas. Eram de uma coleção antiga de tia
Margarida.
Quando
vovô Tomé viu e me chamou. João, deixa isso de banda, guarde as
revistas onde você tirou, venha comigo, tive uma ideia. Vamos ao
armazém de seu Bernardino buscar material.
Ele
me deu a mão e eu estava muito feliz. Não era meu aniversário,
quando, como fazia com os netos e afilhados, ele nos levava ao
armazém de seu Bernardino para comprar um sapato de ver Deus.
No
armazém, depois de uma conversa breve e formal com seu Bernardino,
vovô perguntou se ele lhe podia arranjar um caixote vazio. Seu
Bernardino se espantou com o pedido, vovô ainda não era da
confraria. Quer que eu mande levar, perguntou seu Bernardino. Se me
fizesse a bondade... Eu tive um ímpeto, disse pode deixar que eu
levo. Seu Bernardino olhou para mim, olhou para vovô Tomé, e disse
como ficamos, seu Tomé? Mande levar, disse vovô. E o preço da peça
e do carreto, por favor. Seu Bernardino disse brincando nem o preço
de uma das suas fazendas bastaria. Então lhe mandarei, no fim da
safra, uma saca do melhor café tipo sete. Ora, seu Tomé, e eu ia
aceitar?! Não é pelo caixote, é por nossa velha amizade, disse
vovô Tomé.
Aprendi
então um dos preceitos do seu código de aristocrata rural. Eu e ele
não podíamos fazer qualquer trabalho manual, a nossa posição nos
vedava. O primeiro foi (como esquecer!) quando soube que o delegado
seu Dionísio tinha mandado dar uma surra num preso para ele
confessar. Em homem não se bate, é melhor matar, por respeito à
sua condição de homem, é mais digno. Outro preceito do seu código
de honra aprendi muito menino, quando uma vez, a mando de mamãe, lhe
fui tomar a bênção. Ele me recusou a mão, disse homem não beija
mão de homem. Era um comportamento raro em Duas Pontes, cidade de
velhos patriarcas.
Nem
bem chegamos em casa e veio o empregado com o caixote. Era um caixote
de madeira branca que, pelos dizeres e pelo cheiro, se viu que tinha
servido para embalar bacalhau, madeira das estranjas. Vovô tirou o
paletó, desabotoou o colete, afrouxou o colarinho e começou a fazer
um caminhãozinho para mim. Para quem parecia estar usando as mãos
pela primeira vez, não estava mal. No final da tarde, a obra estava
pronta. Tinha ficado um tanto rústica, mas eu não disse nada a vovô
Tomé, para não atrapalhar a sua satisfação.
No
outro dia dei com vovô Tomé aparando pachorrentamente um pedaço de
pau. Quê que o senhor está fazendo, perguntei. Uma colher de pau
para a Naninha, ela me pediu, disse ele meio envergonhado, talvez
pela sua utilidade doméstica. O senhor parece que não está
gostando, não é, perguntei. Para lhe ser franco, não, disse vovô.
O que gostaria de fazer, um monjolinho, indaguei. Não, gostaria de
fazer nada, disse ele. Nada, à toa? disse eu meio desapontado. Não,
fazendo absolutamente nada, quer dizer, ir aparando vagarosamente a
madeira até não restar mais nada. Assim feito seu Bê, perguntei.
Vovô riu, achava muita graça nas bestagens de seu Bê P. Lima, nas
histórias obscenas que ele contava, quando não tinha menino por
perto, na presença de menino e de mulher ele fechava a cara, metia a
viola no saco, se dava ao respeito. Bê é um artista do nada, por
isso é um homem feliz, disse.
E
vovô Tomé foi ficando um perito na arte dos caracóis. Demorava
muito o aprendizado, ele porém não tinha pressa. Pra quê? dizia,
não falta matéria-prima neste mundo. E brincando, haja povo na
terra para desbastar a floresta amazônica. Às vezes fico imaginando
o povo todo do mundo picando pauzinho. Seria a paz e a união dos
homens.
Eu
tinha um certo medo de que vovô enjoasse do gratuito oficio e
virasse um teórico do não fazer nada, absolutamente nada. Seu Bê,
por exemplo, não tinha dessas cogitações, apenas ia aparando as
suas fitas e caracóis. Vovô não tinha a pachorra e a tranquilidade
de seu Bê. Era exigente, ia ao armazém de seu Bernardino escolher
as melhores madeiras, havia uma certa qualidade de pinho que era em
si uma beleza. A madeira não podia ter olhos nem veios muito
acentuados, nem mistura de tons. Quanto mais lisas e uniformes,
melhor. Quem tem pressa não faz nada, dizia ele já agora
conceituoso. Ele tinha a sua poética, a diferença entre ele e seu
Bê é que seu Bê não tinha poética nenhuma, era um puro artista
do nada.
Com
o passar do tempo, vovô Tomé viu que se aprende até certo ponto,
depois é desaprender de tal maneira que cada dia se tenha diante de
si o puro nada.
E
os anos passaram e eu me afastei de vovô Tomé. Fui para Belo
Horizonte, onde fiz o meu curso superior sustentado por ele. É com
remorso que me lembro de que lhe escrevi apenas umas minguadas
cartas. Em nenhuma delas perguntei como ele ia na sua velha arte.
Fiquei sabendo por uma carta de vovó Naninha que ele tinha morrido.
Voltei
imediatamente a Duas Pontes. Vovó Naninha disse que ele morrera de
pé, feito queria, sem curtir leito de doente, à grande mesa da sala
de jantar, tirando um enorme caracol. Tinha encontrado o seu nada.
Vovó Naninha me deu o seu canivete preferido. Não sei o que fazer
com ele, é de outra maneira que procuro o meu nada.
Autran Dourado, em Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século
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