sexta-feira, 12 de julho de 2024

In illo tempore

Cheguei no dia 18 de março de 1949 para ingressar no Colégio do México como bolsista. Os companheiros que haviam ido receber-me entre eles Sônia Henriquez Unena — levaram-me a uma pensão de estudantes e se despediram. Arrumei meus magros pertences (que incluíam um dicionário de latim) e me dispus a dormir. Depois de uma viagem de trinta e quatro horas, eu estava cansado.
Sonhei que haviam transcorrido dois meses. Nas vésperas do meu regresso a Buenos Aires, Alfonso Reyes me convidava para um fim de semana em um hotel de Cuernavaca e, como despedida, lia para mim sua tradução dos primeiros nove cantos da Ilíada, tradução que eu havia visto progredir, de sábado a sábado, nas inesquecíveis e distantes tardes da “Capela Alfonsina” na então Rua das Indústrias. Alfonso Reyes lendo Homero para mim, sozinho, e a meseta de Anahuac em redor! (Não afirmou Pedro Sarmiento de Gamboa ter encontrado em terra mexicana uma pegada de Ulisses?) Presenteei-o com a adição de poesias completas de Lugones, que incluía suas versões homéricas.
Na manhã seguinte despertei muito cedo. O colégio ficava há pouco mais de uma quadra, na rua Nápoles número 5. Cheguei quando as portas ainda estavam fechadas. Comprei um exemplar de Novedades e me pus a ler. Pouco depois vi Raimundo Lida. Subimos à sala de Filologia, no segundo andar. Uma hora mais tarde, disse-me Lida: “Don Alfonso o espera”. Desci. “Roy, dê-me suas duas mãos. Desde hoje, esta é sua casa. Sente-se”. E, sem mais demora: “Fale-me de Pedro”.
Comecei a falar. Desordenadamente. As lembranças me oprimiam.
Reyes (oh, ele havia sido seu amigo mais íntimo, de perto e de longe, durante quarenta anos) não ocultou sua emoção. A lembrança de Pedro Henrique Urefia, fixa como as estrelas, cálida como a amizade, nos unia.
Passaram os meses. Dias antes do meu regresso a Buenos Aires, Alfonso Reyes convidou-me para um fim de semana em um hotel em Cuernavaca, junto com D. Manuela. Imaginei o que ia ocorrer: levei o livro de Lugones. Durante dois dias (oh, deuses, para mim sozinho) D.
Alfonso me leu sua tradução rimada dos primeiros nove cantos da Ilíada.
Sonhei então, que chegava ao aeroporto da Capital asteca e que os companheiros que tinham ida receber-me, me levaram até uma pensão de estudantes e se despediam. Arrumei meus magros pertences (na verdade pouco usei o dicionário de latim) e ria manhã seguinte, já no Colégio, Raimundo Lida me disse: “Don Alfonso o espera”. Desci.
Roy, dê-me suas duas mãos. Desde hoje, esta é sua casa. Sente-se”. E, sem mais demora: “Fale-me de Pedro”. Comecei a falar. A lembrança de Henriquez Urena nos unia.

Roy Bartholomew, em Livro de Sonhos, de Jorge Luis Borges

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