sexta-feira, 19 de julho de 2024

A Contadora de Filmes | [28]

Nosso povoado era um dos mais pobres da região. As pessoas não tinham nada para ver nem para fazer nas longas tardes do deserto. Não havia uma orquestra para ir dançar, não tínhamos banda de música que tocasse valsinhas nos fins de semana, no coreto da praça. Não tínhamos nem mesmo o dia do trem, que nos outros povoados onde havia estação era dia de festa.
A única coisa que nos restava era o cinema.
Acontece que o salário nem sempre dava para comprar a entrada. Todo mundo vivia de fiado, e para conseguir algum dinheiro antes dos dias de pagamento a maioria acudia para empenhar a carteira de identidade com o agiota.
O agiota se chamava dom Nolasco.
Era um homem comprido, todo cheio de ossos, furtivo feito cachorro do deserto. Com o tempo tinha chegado a se transformar no homem mais odiado da Mina. Não apenas por ser tão avarento, mas porque, além disso, trabalhava como vigilante no único galpão de solteiros do povoado. Lá, tinha de cuidar para que nenhum homem entrasse com bebida ou mulheres em seus quartinhos. E nessas coisas, dom Nolasco era tão rigoroso como na hora de cobrar seus empréstimos.
Nada passava debaixo de seus olhos de coruja.
Nas quintas-feiras, dia de pagamento na Mina, era comum ver as esposas dos peões rogando que, por favor, dom Nolasco, pago metade agora e o resto deixamos para a semana que vem, o que o senhor diz? É que preciso comprar leite para o bebê.
Mas não tinha jeito, o homem era duro e insensível como uma crosta de salitre.
Algumas vezes acompanhei mamãe para empenhar a carteira de identidade do meu pai e vi a cara inexpressiva do homem.
De verdade, parecia osso puro.
Ninguém jamais o havia visto sorrir.

Hernán Rivera Letelier, em A Contadora de Filmes

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