A
primeira pessoa que me contratou foi dona Mercedes Morales, a
costureira que vivia em frente da praça, uma das melhores mulheres
que conheci na vida. Dona Mercedes mandou me buscar para que eu
contasse La Violetera, filme interpretado por Sarita Montiel e
Raf Vallone, que tinha passado no cinema uma semana antes. Ela não
assistiu porque havia ido até o porto comprar tecidos e botões.
Eu
me lembrava perfeitamente do filme. E a canção que dava o título
eu sabia de cor, porque sempre tocava no rádio.
Além
disso, na tarde em que cantei essa canção em casa havia recebido um
dos aplausos mais longos da minha nascente carreira.
Assim
que naquele dia, depois do almoço, parti para a casa da costureira.
Meu irmão Mirto, forçado por meu pai, me ajudou a levar o caixote
de chá com toda a minha cenografia espanhola. A mulher ficou
encantada e foi muito generosa. Além de me dar uma blusa de tafetá
de presente, de cor púrpura e com rendinhas, me pagou mais do que
juntávamos em dois dias de doações em casa.
Dali
em diante começaram a chegar montões de convites de outras casas.
Quase
sempre era para contar filmes a anciãs ou anciões doentes, que não
podiam ir até o cinema. O problema é que alguns me pediam filmes
muito antigos, ou que eu não tinha visto. Com os antigos não tinha
problema, partindo do pouco que eu me lembrava e com o muito que eu
punha da minha própria lavra, dava muito bem para seguir em frente.
Só uma vez me atrevi a contar um filme que eu não tinha visto. Foi
quando dona Filiberta, a dona da única loja de balas e caramelos do
povoado, mandou me chamar.
A
anciã, meio louca segundo todo mundo dizia, estava a ponto de morrer
e queria que eu contasse para ela um velho film – disse assim
mesmo: film – de Libertad Lamarque. O filme se chamava Besos
brujos, e dona Filiberta, revirando os olhos em branco, disse que
lhe trazia recordações de um amor inesquecível. E me contou que a
cena que mais recordava era quando Lamarque, banhando-se num belo
lago de águas azuis (embora os filmes daquele tempo fossem em
branco e preto, ela disse águas azuis), cantava uma canção linda
que se chamava Feito o passarinho.
– Você
viu esse filme, menina? – me perguntou ela.
Eu
menti, disse que sim, mas que não me lembrava muito bem. Que quando
vi ainda era muito pequena. Mas que se ela me refrescasse um pouco a
memória… A anciã, além de me fazer uma longa sinopse, com
variados detalhes de trajes e paisagens, cantou inteirinha a canção
do passarinho. Com isso tudo armei rapidamente uma história e fiquei
contando o filme até que ela adormeceu.
Dona
Filiberta, que já tinha noventa e dois anos de idade, e que havia
enviuvado três vezes, morreu dois dias depois de eu ter estado em
sua casa. Seus parentes, após o funeral, contavam a história de que
a vovó Fili, como a chamavam, tinha dito que o filme que a menininha
contou “nem chegava perto” do que ela havia visto, mas que ainda
assim tinha gostado muito. Até mesmo mais que do outro.
“O
outro durava apenas uma hora e quinze”, ela havia dito sorrindo. “E
essa menininha me contou um de quase duas horas”.
Os
parentes diziam que ela tinha morrido feliz.
Hernán Rivera Letelier, em A Contadora de Filmes
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