quinta-feira, 6 de junho de 2024

Um adolescente: C. J.

Ele é grande, tem ombros de ossos largos, anda um pouco curvo: isto passa, é o peso da adolescência. Ele é lento, ele é profundo, ele semeia devagar. Na cara de camponês grosso a profundeza calada de camponês. Ele dormirá bem com uma mulher. Se não se enrolar demais nos largos e fundos meandros de suas pesadas hesitações. Ele é calado, não sabe ainda falar o que se costuma falar, e então não diz. Também não sabe que tem pernas retas, pesadas e bonitas. Uma vez falou: quero qualquer profissão que me baste para viver; pois enquanto isso teria tempo de fazer alguma coisa “concreta, muito objetiva”. Ele é desastrado, quebra coisas sem querer, pede desculpas com um meio sorriso assustado. É preciso ter paciência com ele. É preciso ter paciência com os que são grandes como ele. Tanta paciência. Porque ele pode vir a ser esse silencioso desastrado a vida toda, e não passar disso. É um dos tipos de adolescência mais perigosos: aquele em que muito cedo já se é um homem um pouco curvo, e também nele se sente a grandeza sem palavras.

Clarice Lispector, in Todas as crônicas

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