Mandei
logo para a imprensa uma notícia discreta, dizendo que provavelmente
começaria a publicação de um jornal oposicionista, daí a algumas
semanas, redigido pelo Doutor Brás Cubas. O Quincas Borba, a quem li
a notícia, pegou da pena, e acrescentou ao meu nome, com uma
fraternidade verdadeiramente humanista, esta frase: “um dos mais
gloriosos membros da passada câmara”.
No
dia seguinte entra-me em casa o Cotrim. Vinha um pouco transtornado,
mas dissimulava, afetando sossego e até alegria. Vira a notícia do
jornal, e achou que devia, como amigo e parente, dissuadir-me de
semelhante ideia. Era um erro, um erro fatal. Mostrou que eu ia
colocar-me numa situação difícil e de certa maneira trancar as
portas do parlamento. O ministério, não só lhe parecia excelente,
o que aliás podia não ser a minha opinião, mas com certeza viveria
muito; e que podia eu ganhar com indispô-lo contra mim? Sabia que
alguns dos ministros me eram afeiçoados; não era impossível uma
vaga, e... Interrompi-o nesse ponto, para lhe dizer que meditara
muito o passo que ia dar, e não podia recuar uma linha. Cheguei a
propor-lhe a leitura do programa, mas ele recusou energicamente,
dizendo que não queria ter a mínima parte no meu desatino.
– E
um verdadeiro desatino, repetiu ele; pense ainda alguns dias, e verá
que é um desatino.
A
mesma coisa disse Sabina, à noite, no teatro. Deixou a filha no
camarote, com Cotrim, e trouxe-me ao corredor.
– Mano
Brás, que é que você vai fazer? perguntou-me aflita. Que ideia é
essa de provocar o governo, sem necessidade, quando podia...
Expliquei-lhe
que não me convinha mendigar uma cadeira no parlamento; que a minha
ideia era derribar o ministério, por não me parecer adequado à
situação – e a certa fórmula filosófica; afiancei que
empregaria sempre uma linguagem cortês, embora enérgica. A
violência não era especiaria do meu paladar. Sabina bateu com o
leque na ponta dos dedos, abanou a cabeça, e tornou ao assunto com
um ar de súplica e ameaça, alternadamente; eu disse-lhe que não,
que não, e que não. Desenganada, lançou-me em rosto preferir os
conselhos de pessoas estranhas e invejosas aos dela e do marido. –
Pois siga o que lhe parecer, concluiu; nós cumprimos a nossa
obrigação. Deu-me as costas e voltou ao camarote.
Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas
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