As
guerras santas
Da
América chegam os heraldos da boa-nova. O imperador fecha os olhos e
assiste o avanço das velas e sente o cheiro do breu e do sal.
Respira o imperador como o mar, maré cheia, maré vazia; e sopra
para apressar os navios inchados de tesouros.
A
Providência acaba de dar-lhe de presente um novo reino, onde o
ouro e a prata abundam como o ferro em Vizcaya. O assombroso
tesouro está a caminho. Com ele poderá tranquilizar os banqueiros
que o enforcam e poderá finalmente pagar os seus soldados, lanceiros
suíços, mercenários alemães, infantes espanhóis, que não veem
uma moeda nem em sonhos. O resgate de Atahualpa financiará as
guerras santas contra a meia-lua do Islã, que chegou às portas de
Viena, e contra os hereges que seguem Lutero na Alemanha. O imperador
armará uma grande frota para varrer do Mediterrâneo o sultão
Solimão e o velho pirata Barba Roxa.
O
espelho devolve ao imperador a imagem do deus da guerra: a armadura
adamascada, com rendas cinzeladas ao bordo da gola e da couraça, o
casco de plumas, o rosto iluminado pelo sol da glória: as
sobrancelhas ao ataque sobre os olhos melancólicos, o barbudo queixo
lançado para a frente. O imperador sonha com Argel e escuta o
chamado de Constantinopla. Tunes, caída em mãos infiéis, também
espera pelo general de Jesus Cristo.
Eduardo Galeano, in Os Nascimentos
Nenhum comentário:
Postar um comentário