quarta-feira, 29 de maio de 2024

O julgamento de Zé Bebelo (excerto)


[...]
Artes o advôgo ― aí é que vi. Alguém quisesse? Duvidei, foi o que foi. Digo ao senhor! estando por ali para mais de uns quinhentos homens, se não minto. Surgiu o silêncio deles todos. Aquele silêncio, que pior que uma alarida. Mas, por que não davam brados, não falavam todos total, de torna vez, para Zé Bebelo ser botado solto?... me enfezei. Sus, pensei, com um empurrão de força em mim. Ali naquelhorinha ― meu senhor ― foi que eu lambi ideia de como às vezes devia de ser bom ter grande poder de mandar em todos, fazer a massa do mundo rodar e cumprir os desejos bons da gente. De sim, sim, pingo. Acho que eu tinha suor nas beiras da testa. Ou então ― eu quis ― ou, então, que se armasse ali mesmo rixa feia: metade do povo para lá, metade para cá, uns punindo pelo bem da justiça, os outros nas voltas da cauda do demo! Mas que faca e fogo houvesse, e braços de homens, até resultar em montes de mortos e pureza de paz... Sal que eu comi, só.
Abre que, ah, outra vez, Joca Ramiro reproduziu a pergunta:
Que se tiver algum... ― e isto e aquilo, tudo o mais.
Me armei dum repente. Me o meu? Eu agora ia falar ― por que era que não falava? Aprumei corpo. Ah, mas não acertei em primeiro: um outro começou. Um Gú, certo papa-abóbora, beiradeiro, tarraco mas da cara comprida; esse discorreu:
Com vossas licenças, chefe, cedo minha rasa opinião. Que é ― se vossas ordens forem de se soltar esse Zé Bebelo, isso produz bem... Oséquio feito, que se faz, vem a servir à gente, mais tarde, em alguma necessidade, que o caso for... Não ajunto por mim, observo é pelos chefes, mesmo, com esta vênia. A gente é braço d armas, para o risco de todo dia, para tudo o miúdo do que vem no ar. Mas, se alguma outra ocasião, depois, que Deus nem consinta, algum chefe nosso cair preso em mão de tenente de meganhas ― então também hão de ser tratados com maior compostura, sem sofrer vergonhas e maldades... A guerra fica sendo de bem-criação, bom estatuto...
Aquilo era razoável. A ver, tinha saído tão fácil, até Joca Ramiro, em passagens, animou o Gú, com acenos. Tomei coragem mais comum. Abri a minha boca. Aí, mas, um outro campou ligeiro, tomou a mão para falar. Era um denominado Dósno, ou Dósmo, groteiro de terras do Cateriangongo ― entre o Ribeirão Formoso e a Serra Escura ― e ele tinha olhos muito incertos e vesgava. Que era que podia guardar para dizer um homem desses, capiau medido por todos os capiaus do meu Norte? Escutei.
Tomém pego licença, sôs chefes. Em que pior não veja, destorcendo meu desatino. E-que, é-que... Que eu acho que seja melhor, em antes de se remitir ou de se cumprir esse homem, pois bem! indagar de fazer ele dizer ond é que estão a fortuna dele, em cobre... A mò que se diz ― que ele possederá o bom dinheiro, em quantia, amoitado por aí... E só, por mim, é só, com vosso perdão... Com vosso perdão...
Riram, uns; por que é que riram? ― rissem. Dei como um passo adiante, levantei mão e estalei dedo, feito menino em escola. Comecei a falar. Diadorim ainda experimentou de me reter, decerto assustado! ― Espera, Riobaldo... ― tive o siso da voz dele no ouvido. Aí eu já tinha principiado. O que eu acho, disse, supri neste mais menos fraseado!
Dê licença, grande chefe nosso, Joca Ramiro, que licença eu peço! O que tenho é uma verdade forte para dizer, que calado não posso ficar...
Digo ao senhor! que eu mesmo notei que estava falando alto demais, mas de me abrandar não tinha prazo nem jeito ― eu já tinha começado. Coração bruto batente, por debaixo de tudo. Senti outro fogo no meu rosto, o salteio de que todos a finque me olhavam. Então, eu não aceitei ninguém, o que eu não queria era ver o Hermógenes. Não pôr as capas dos olhos nem a ideia no Hermógenes ― que Hermógenes nenhum neste mundo não tivesse, nenhum para mim, nenhum de si! Por isso, prendi minhas vistas só num homem, um que foi o qualquer, sem nem escôlha minha, e porque estava bem por minha frente, um pardo. Pobre, esse, notando que recebia tanto olhar, abaixou a cara, amassado de não poder outra coisa. No eu falando!
― … Eu conheço este homem bem, Zé Bebelo. Estive do lado dele, nunca menti que não estive, todos aqui sabem. Saí de lá, meio fugido. Saí, porque quis, e vim guerrear aqui, com as ordens destes famosos chefes, vós... Da banda de cá, foi que briguei, e dei mão leal, com meu cano e meu gatilho... Mas, agora, eu afirmo: Zé Bebelo é homem valente de bem, e inteiro, que honra o raio da palavra que dá! Aí. E é chefe jagunço, de primeira, sem ter ruindades em cabimento, nem matar os inimigos que prende, nem consentir de com eles se judiar... Isto, afirmo! Vi. Testemunhei. Por tanto, que digo, ele merece um absolvido escorreito, mesmo não merece de morrer matado à-tóa... E isto digo, porque de dizer eu tinha, como dever que sei, e cumprindo a licença dada por meu grande chefe nosso, Joca Ramiro, e por meu cabo-chefe Titão Passos!...
Tirei fólego de fólego, latejei. Sei que me desconheci. Suspendi do que estava:
― … A guerra foi grande, durou tempo que durou, encheu este sertão. Nela todo o mundo vai falar, pelo Norte dos Nortes, em Minas e na Bahia toda, constantes anos, até em outras partes... Vão fazer cantigas, relatando as tantas façanhas... Pois então, xente, hão de se dizer que aqui na Sempre-Verde vieram se reunir os chefes todos de bandos, com seu cabras valentes, montoeira completa, e com o sobregoverno de Joca Ramiro ― só para, no fim, fim, se acabar com um homenzinho sozinho ― se condenar de matar Zé Bebelo, o quanto fosse um boi de corte? Um fato assim é honra? Ou é vergonha?...
Para mim, é vergonha... ― o que em brilhos ouvi: e quem falou assim foi Titão Passos.
Vergonha! Raios diabos que vergonha é! Estrumes! A vergonha danada, raios danados que seja!... ― assim; e quem gritou, isto a mais, foi Só Candelário.
Tudo tão aos traques de-repente, não sei, eu nem acabei o relance que me arrepiou minha ideia! que eu tinha feito grande toleima, que decerto ia ser para piorar ― o que foi no eu dizer que Zé Bebelo não matava os presos; porque, se do nosso lado se matava, então não iam gostar de escutar aquilo de mim, que podia parecer forte reprovação. Aos brados bramados de Sô Candelário, temi perder a vez de tudo falar. Aí, nem olhei para Joca Ramiro ― eu achasse, ligeiro demais, que Joca Ramiro não estava aprovando meu saimento. Aí, porque nem não tive tempo ― porque imediato senti que tinha de completar o meu, assim!
― … A ver. Mas, se a gente der condena de absolvido! soltar este homem Zé Bebelo, a mãvazias, punido só pela derrota que levou ― então, eu acho, é fama grande. Fama de glória! que primeiro vencemos, e depois soltamos... ―; em tanto terminei de pensar! que meu receio era tolo! que, jagunço, pelo que é, quase que nunca pensa em reto! eles podiam achar normal que da banda de cá os inimigos presos a gente matasse, mas apreciavam também que Zé Bebelo, como contrário, tivesse deixado em vida os companheiros nossos presos. Gente airada...
― … Seja fama de glória! Só o que sei... Chagas de Cristo!... ― êta Sô Candelário tornou a atalhar. Desadorou-se! Senhor de bofe bruto, sapateou, de arrompe! os de perto se afastando, depressa, por a ele darem espaço. Agora o Hermógenes havia de alguma coisa dizer? O Hermógenes experimentava os dentes nos beiços. Ricardão fazia que cochilava. Sô Candelário era de se temer inteiro.
Somente que, em vez do trestampo, que a gente esperasse, e que ninguém bridava, ele Sô Candelário espiou para cima, às pasmas, consoante sossegado estúrdio recitou, assim em tom ― a bonita voz, de espírito!
― … Seja a fama de glória... Todo o mundo vai falar nisso, por muitos anos, louvando a honra da gente, por muitas partes e lugares. Hão de botar verso em feira, assunto de sair até divulgado em jornal de cidade... ― Ele estava mandarino, mesmo.
Aí eu pensei, eu achei? Não. Eu disse. Disse o verdadeiro, o ligeiro, o de não se esperar para dizer: ― ...E, que perigo que tem? Se ele der a palavra de nunca mais tornar a vir guerrear com a gente, decerto cumpre. Ele mesmo não há de querer tornar a vir. E o justo. Melhor é se ele der a palavra de que vais-s embora do Estado, para bem longe, em desde que não fique em terras daqui nem da Bahia... ― eu disse; disse mansinho mãe, mansice, caminhos de cobra.
Tenho uns parentes meus em Goiás... ― Zé Bebelo falou, avindado de repente. E falou quando não se aguardava, e também assim com tanta vontade de falar, que alguns muito se riram. Eu não ri. Tomei uma respiração, e aí vi que eu tinha terminado. Isto é, que comecei a temer. Num esfrio, num átimo, me vesti de pavor. O que olhei ― Joca Ramiro teria estado a gestos? ― Joca Ramiro fazendo um gesto, então queria que eu calasse absolutamente a boca; eu não possuía vênia para discorrer no que para mim não era de minha alta conta. Eu quis, de repentemente, tornar a ficar nenhum, ninguém, safado humildezinho...
Mas Titão Passos trucou, senhor-moço. Titão Passos levantava a testa. Ele, que no normal falava tão pouco, pudesse dar capacidade de tantas constâncias?
Titão Passos disse: ― … Então, ele indo para bem longe, está punido, desterrado. E o que eu voto por justo. Crime maior ele teve? Pelos companheiros nossos, que morreram ou estão ofendidos passando mal, tenho muito dó...
Sô Candelário disse! ― … Mas morrer em combate é coisa trivial nossa; para que é que a gente é jagunço?! Quem vai em caça, perde o que não acha...
Titão Passos disse! ― … E mortes tantas, isso não é culpa de chefe nenhum. Digo. E mais que esses grandes de nossa amizade! doutor Mirabô de Melo, coronel Caetano, e os outros ― hão de concordar com a resolução que a gente tome, em desde que seja boa e de bom proveito geral. E o que eu acho, Chefe. As ordens... ― Titão Passos terminou.
O silêncio todo era de Joca Ramiro.
Era de Zé Bebelo e de Joca Ramiro.
Ninguém não reparava mais em mim, não apontavam o eu ter falado o forte solene, o terrivelmente; e então, agora, para todos os de lá, eu não existisse mais existido? Só Diadorim, que quase me abraçava! ― Riobaldo, tu disse bem! Tu é homem de todas valentias... Mas, os outros, perto de mim, por que era que não me davam louvor, com as palavras! ― Gostei de ver! Tatarana! Assim é que é assim! ―? Só, que eu tinha pronunciado bem, Diadorim mais me disse! e que tinha sido menos por minhas tantas palavras, do que pelo rompante brabo com que falei, acendido, exportando uma espécie de autoridade que em mim veio. E para Zé Bebelo eu não tinha olhado. Que era que ele de mim devia de estar pensando? E Joca Ramiro? Esses se fronteavam! um ao outro, e o em meio, se mediam.
Rente que nesse resto de tempo decerto cruzaram palavras, que não deram para eu ouvir. Pois porque Zé Bebelo teve ordem de falar, devia de ter tido. A licença. Principiou. Foi discorrendo vagaroso, de entremeado, coisa sem coisa. Vi e vi! ele estava só apalpando o vau. Sujeito finório. Aí o qualquer zunzo que houvesse, ele colhia e entendia no ar ― estava com as orêlhas por isso, aquela cabeça sobrenadando. Já um pouco descabelado. Mas serenou sota, para diante.
― … Altas artes que agradeço, senhor chefe Joca Ramiro, este sincero julgamento, esta bizarria... Agradeço sem tremor de medo nenhum, nem agências de adulação! Eu. José, Zé Bebelo, é meu nome: José Rebêlo Adro Antunes! Tataravó meu Francisco Vizeu Antunes ― foi capitão-de-cavalos... Demarco idade de quarenta-e-um anos, sou filho legitimado de José Ribamar Pachêco Antunes e Maria Deolinda Rebêlo; e nasci na bondosa vila mateira do Carmo da Confusão...
Oragos. Para que a tanta sensaboria toda, essas filosofias? Mas porém ele pronunciava com brio, sem as papeatas de em antes, sem o remonstrar nem os reviretes:
― … Agradeço os que por mim bem falaram e puniram... Vou depor. Vim para o Norte, pois vim, com guerra e gastos, à frente de meus homens, minha guerra... Sou crescido valente, contra homens valentes quis dar o combate. Não está certo? Meu exemplo, em nomes, foram estes: Joca Ramiro, Joãozinho Bem-Bem, Só Candelário!... e tantos outros afamados chefes, uns aqui presentes, outros que não estão... Briguei muito mediano, não obrei injustiça nem ruindades nenhumas; nunca disso me reprovam. Desfaço de covardes e de biltragem! Tenho nada ou pouco com o Governo, não nasci gostando de soldados... Coisa que eu queria era proclamar outro governo, mas com a ajuda, depois, de vós, também. Estou vendo que a gente só brigou por um mal-entendido, maximé. Não obedeço ordens de chefes políticos. Se eu alcançasse, entrava para a política, mas pedia ao grande Joca Ramiro que encaminhasse seus brabos cabras para votarem em mim, para deputado... Ah, este Norte em remanência: progresso forte, fartura para todos, a alegria nacional! Mas, no em mesmo, o afã de política, eu tive e não tenho mais... A gente tem de sair do sertão! Mas só se sai do sertão é tomando conta dele a dentro... Agora perdi. Estou preso. Mudei para adiante! Perdi ― isto é ― por culpa de má-hora de sorte; o que não creio. Altos descuidos alheios... De ter sido guardado prisioneiro vivo, e estar defronte de julgamento, isto é que eu louvo, e que me praz. Prova de que vós nossos jagunços do Norte são civilizados de calibre! que não matam com o distrair de mão um qualquer inimigo pegado. Isto aqui não são essas estrebarias... Estou a cobro de desordens malinas. Estimei. Dou viva Joca Ramiro, seus outros chefes, comandantes de seus terços. E viva sua valente jagunçada! Mas, homem sou. Sou de altas cortesias. Só que medo não tenho; nunca tive, no travável...
Anda que fez um gesto bonito. Assaz, aí, se espiritou. Ao que, de vez, foi grandeúdo!
...Uê, vim guerrear, de peito aberto, com estrondos. Não vim socolor de disfarces, com escondidos e logro. Perdi, por um desguardo. Não por má chefia minha! Não devia de ter querido contra Joca Ramiro dar combate, não devia-de. Não confesso culpa nem retrauta, porque minha regra é! tudo que fiz, valeu por bem feito. E meu consueto. Mas, hoje, sei! não devia-de. Isto é! depende da sentença que vou ter, neste nobre julgamento. Julgamento, digo, que com arma ainda na mão pedi; e que deste grande Joca Ramiro mereci, de sua alta fidalguia... Julgamento ― isto, é o que a gente tem de sempre pedir! Para que? Para não se ter medo! E o que comigo é. Careci deste julgamento, só por verem que não tenho medo... Se a condena for às ásperas, com a minha coragem me amparo. Agora, se eu receber sentença salva, com minha coragem vos agradeço. Perdão, pedir, não peço! que eu acho que quem pede, para escapar com vida, merece é meia-vida e dobro de morte. Mas agradeço, fortemente. Também não posso me oferecer de servir debaixo darmas de Joca Ramiro ― porque tanto era honra, mas não condizia bem. Mas minha palavra dando, minha palavra as mil vezes cumpro! Zé Bebelo nunca roeu nem torceu. E, sem mais por dizer, espero vossa distinta sentença. Chefe. Chefes.
Digo ao senhor, foi um momento movimentado.
Zé Bebelo, acabando nas palavras, ali sentadinho ficou, repequeno, pequenininho, encolhido ao mais. Já um pouco descabelado. Era uma bolinha de gente. Fechou-se um homem. Olhei, olhei. Só a gente mal ouvisse o sussurro de todos lá; que foi bom: conheci que era. ― O sujeito machacá! Assopres! ― Arre, maluco é ― mas frege... Capaz que castra garrote com as unhas dos dedos... Não o que Diadorim não disse ― mas ele estava assim por pálido. Vai, vi os chefes. Eles conversaram um circuitozinho, ligeiro. O Hermógenes e o Ricardão ― e Joca Ramiro para eles sorriu, seus compadres. O Ricardão e o Hermógenes ― eles dois eram chouriço e morcela. Só Candelário ― conforme seus conformes, avançante ― Joca Ramiro sorriu para Só Candelário. O jeito de João Goanhá ― richarte. Só Titão Passos espiava desolhadamente, ele tão aposto homem tão bom, tão sério: com as mãos ajuntadas baixo, em frente da barriga ― só esperava o nada virar coisas. Acontecesse o que. Joca Ramiro ia decidir! Sobre o simples, o Hermógenes ainda ia se debruçar, para um dizer em orêlha. Mas Joca Ramiro encurtou tudo num gesto. Era a hora. O poder dele veio distribuído endireito em Zé Bebelo. O quando falou:
O julgamento é meu, sentença que dou vale em todo este norte. Meu povo me honra. Sou amigo dos meus amigos políticos, mas não sou criado deles, nem cacundeiro. A sentença vale. A decisão. O senhor reconhece?
Reconheço ― Zé Bebelo aprovou, com firmeza de voz, ele já descabelado demais. Se fez que as três vezes, até: ― Reconheço. Reconheço! Reconheço... ― estréques estalos de gatilho e pinguelo ― o que se diz! essas detonações.
Bem. Se eu consentir o senhor ir-se embora para Goiás, o senhor põe a palavra, e vai?
Zé Bebelo demorou resposta. Mas foi só minutozinho. E, pois!
A palavra e vou, Chefe. Só solicito que o senhor determine minha ida em modo correto, como compertence.
A falando?
Que! se ainda tiver homens meus vivos, presos também por aí, que tenham ordem de soltura, ou licença de vir comigo, igualmente...
Ao que Joca Ramiro disse! ― Topo. Topo.
― … E que, tendo nenhum, eu viaje daqui sem vigia nenhuma, nem guarda, mas o senhor me fornecendo animal-de-sela arreado, e as minhas armas, ou boas outras, com alguma munição, mais o de-comer para os três dias, legal...
Ao que aí Joca Ramiro assim três vezes! ― Topo. Topo!
― … Então, honrado vou. Mas, agora, com sua licença, a pergunta faço! pelo quanto tempo eu tenho de estipular, sem voltar neste Estado, nem na Bahia? Por uns dois, três anos?
Até enquanto eu vivo for, ou não der contra-ordem...
Joca Ramiro aí disse, em final. E se levantou, num de repente. Ah, quando ele levantava, puxava as coisas consigo, parecia ― as pessoas, o chão, as árvores desencontradas. E todos também, ao em um tempo ― feito um boi só, ou um gado em círculos, ou um relincho de cavalo. Levantaram campo. Reinou zoeira de alegria! todo o mundo já estava com cansaço de dar julgamento, e se tinha alguma certa fome.
[…]

Guimarães Rosa, in Grande sertão: veredas

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