quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

A Contadora de Filmes | [6]


Lembro que quando minha mãe estava com a gente – antes que acontecesse a desgraça – éramos uma família completa, e lembro que meu pai trabalhava (e não bebia tanto), e que ela o recebia com um beijo quando ele chegava do trabalho, e que nos fins de semana íamos todos juntos, os sete, ao cinema.
Como eu gostava do ritual de se preparar para ir ao cinema!
Meu pai chegava dizendo “Hoje vão passar um com o Audie Murphy!” (naquele tempo, eram os astros e estrelas quem dava categoria aos filmes).
Então a gente punha as nossas melhores roupas. A gente punha até sapato. Minha mãe penteava cada um dos meus irmãos; penteava com limão, e fazia um risco que parecia feito com régua. Menos o Marcelino, o quarto dos meus irmãos, que tinha um cabelo duro feito crina e por mais que o penteassem do jeito que fosse, acabava sempre com a cabeça parecendo um livro aberto. Em mim ela fazia um rabo de cavalo, que prendia com elásticos negros, tão apertado que eu achava que os olhos iam saltar da minha cara.
A gente ia sempre à sessão vespertina.
Eu adorava, porque para mim o entardecer era a hora mais bonita do pampa. Os últimos raios de sol pintavam de ouro o óxido das chapas de zinco e as cores do crepúsculo faziam jogo com os lenços de seda que minha mãe usava.
Ela adorava lenços de seda.
Tal como era costume no deserto, nós íamos pelo meio da rua de terra, de frente para os arrebóis, aquela hora em que a cor do sol se misturava a todas as outras. Meu pai caminhava levando minha mãe pelo braço, e todos os homens que passavam o cumprimentavam.
Boa tarde, mestre Castillo!”
Boas, senhor fulano!”
Eu reparava que o cumprimentado era ele, mas a olhada era minha mãe. É que ela era muito linda e jovem, e ao andar movia as cadeiras como as atrizes dos filmes.
Ao chegar à esquina do cinema nós ouvíamos a música emergindo dos velhos alto-falantes e nossos corações se enchiam de júbilo. Fora da sala havia carrinhos com docinhos e essas coisas. Minha mãe comprava pastilhas Namoro para ela e para papai, e um saco de pipocas açucaradas para cada um de nós.
Éramos quase sempre dos primeiros a entrar no cinema.

Hernán Rivera Letelier, in A Contadora de Filmes

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