Cerimônia
de comunhão
O
mar os engoliu, os vomitou, tornou a engoli-los e os espatifou contra
as pedras. Pelos ares voavam toninhas e golfinhos e o céu inteiro
era de espuma. Quando o pequeno navio saltou em pedaços, os homens
se abraçaram como puderam aos penhascos. Durante toda a noite, as
ondas lutaram para arrancá-los, golpe a golpe; muitos se soltaram e
foram arrebentados pelas ondas contra as pedras, e depois as ondas os
devoraram.
Ao
amanhecer, cessou a tempestade e baixou a maré. Os que se salvaram
tomaram o rumo da sorte e se deixaram ir em uma canoa esfrangalhada.
Faz
cinco dias que os náufragos derivam pelos arrecifes. Não
encontraram água doce nem fruto nenhum para levar à boca.
Esta
manhã, desembarcaram em uma das ilhotas.
Avançam
de quatro, debaixo de um sol de fritar pedras. Não há quem tenha
forças para arrastar os que ficam. Despidos, machucados, amaldiçoam
o capitão, o doutor Alonso Zuazo, bom advogado e mau navegante, e
amaldiçoam a mãe que o pariu, e o rei e o papa e Deus.
Este
montinho é a montanha mais alta do mundo. Os homens vão subindo e
se consolam contando as horas que faltam para morrer.
E
de repente, esfregam os olhos. Não podem crer. Cinco tartarugas
gigantes esperam por eles na praia. Cinco tartarugas dessas que sobre
o mar parecem rochedos e fazem o amor sem alterar-se enquanto roçam
os navios.
Os
náufragos se atiram. Agarram-se nos cascos, uivando de fome e raiva,
e empurram até dar a volta nas tartarugas, que ficam chutando de
barriga para cima, e cravam seus punhais e a punhaladas e socos abrem
os ventres e afundam suas cabeças no sangue que emana.
E
adormecem. Deixam-se ficar, abandonam-se mergulhados no sangue,
metidos até o pescoço nestes barris de bom vinho, enquanto o sol
continua sua lenta marcha até o centro do céu.
Ninguém
escuta o doutor Alonso Zuazo. Com a boca untada, o doutor ajoelha-se
na areia, ergue as mãos e oferece as tartarugas às cinco chagas de
Nosso Redentor.
Eduardo Galeano, in Os Nascimentos
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