Em
marcha, heroico, alado pé de verso,
busca-me
o gral onde sangrei meus deuses:
conta
às suas relíquias, ontem de ouro,
hoje
de obscura cinza, pó de tempo,
que
ele os venera ainda, o jogral verde
que
outrora celebrou seus milagres fecundos.
Dize
a eles que vinham
tecer
silentes minha eternidade
que
a lava antiga é pura cal agora
e
queima-lhes incenso, e rouba-me farrapos
de
seus mantos desertos de oferendas
onde
possa chorar meu disfarce ferido.
Dize
a eles que tombam
como
chuvas de sêmen sobre campos de sal
sem
mancha, mas terríveis
que
desçam sobre a urna deste olvido
e
engendrem rosas rubras
do
estrume em que tornei seus dons de trigo e vinho.
Segue,
elegia, busca-me nos portos
e
nas praias de Antanho, e nas rochas de Algures
os
deuses que afoguei no mar absurdo
de
um casto sacrifício.
Apanha
estas palavras do chão túmido
onde
as deixo cair, findo o dilúvio:
forma
delas um palco, um absoluto
onde
possa dançar de novo, nu
contra
o peso do mundo e a pureza dos anjos,
até
que a lucidez venha construir
um
templo justo, exato, onde cantemos.
Mário Faustino, in O homem e sua hora
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