Costumo
aceitar qualquer tipo de convite para participar de uma feira de
livro de uma cidade da Amazônia. No início, ia por curiosidade e
por uma neurótica obsessão de querer conhecer tudo e todos. Já
passei por Paraopeba, Carajás, Altamira, São Félix do Xingu,
Tucuruí, entre outras. Cheguei a escrever para a Folha, há
mais de dois anos, sobre o encontro dos índios de Altamira, na
condição de um suposto “especialista”. Lógico que tantas
viagens acabaram resultando num livro: Ua:brari.
Sou
doente pela Amazônia. Consumidor voraz de tucunarés, filhotes,
cupuaçus etc. É o cenário ideal para grandes épicos. Extremo, o
povo mais primitivo das Américas convive com as rotas dos vícios
modernos: da cocaína aos computadores. A natureza luta em pé de
igualdade com o homem. Ganhou das empreiteiras, erodindo a
Transamazônica e a Perimetral Norte. Perdeu feio dos garimpeiros e
dos projetos das mineradoras. Uma pena que a mídia brasileira tenha
transformado o tema em suco. A floresta merecia mais respeito.
Paciência.
Quando
chegou o convite para participar da IV Feira de Livros de Marabá,
nem hesitei. Fui correndo, mesmo ciente de que nove pessoas ouviram
falar de mim nesse fim de mundo, e que dessas nove, seis, no máximo,
leram meus livros; por vezes, tenho este ataque de humildade e vou ao
encontro de leitores que não me conhecem, o que sugere meu fracasso
profissional.
Sentei-me
numa mesa, rodeado de livros, disposto a autografar minha “vasta
obra”, mesmo sabendo que ninguém apareceria. Mentira. Meus seis
leitores estavam a postos, me esperando no galpão da feira. Dei os
autógrafos lentamente, para que os visitantes vissem a fila e se
interessassem. Torci para que meus leitores não desaparecessem.
Puxei assunto. Contei piadas. Inúteis. Assim que eu assinava,
sumiam. Não demorou muito, fiquei jogado no canto, a sós, cercado
pela minha “obra”. Muitos pensavam que eu fazia parte da
organização ou que eu pertencia ao balcão de informações. Me
perguntavam onde era o banheiro, onde estava exposto o livro do
“fulano de tal”. Eu apontava para um lugar qualquer: “É lá!”
Outros me perguntavam o preço do livro do “sicrano de tal”. Eu
respondia qualquer preço. Já houve uma época em que eu me dedicava
às complexas leis do mercado literário e, como um bom vendedor,
respondia: “Não sei onde está o livro do ‘fulano’, mas sei
onde está o do grande escritor Marcelo Paiva.” “Ele é bom?”,
me perguntavam. “Lógico.” E fazia uma centena de elogios
literários ao dito autor, analisando o foco narrativo, personagens
esféricos etc. Hoje, não tenho mais saco para esse tipo de coisa;
talvez por isso, empobreço vertiginosamente.
Marcelo Rubens Paiva, in Crônicas para ler na Escola
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