quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Cartas na Rua | Dois — 1

Enquanto isso, a vida seguia em frente. Tive uma longa sequência de sorte nas corridas de cavalo. Comecei a me sentir confiante quando estava lá. Todo dia dava para esperar um certo lucro, algo entre quinze e quarenta pratas. Eu não queria ganhar uma bolada. Se não acertasse nos primeiros páreos, apostava só um pouco mais, o suficiente para que, se o cavalo ganhasse, a margem de lucro estivesse garantida. Eu voltava todos os dias, dia após dia, vencedor, erguendo meu polegar em aprovação enquanto dirigia pela rua.
Então Betty arrumou um emprego como datilógrafa, e quando uma dessas parceiras de sexo arranja um emprego, você logo nota a diferença. Continuávamos bebendo toda a noite e ela saía antes de mim de manhã, com uma ressaca das brabas. Agora ela ia sentir na pele o horror. Eu me levantava por volta das dez e meia da manhã, tomava um copo de café sem pressa, comia dois ovos, brincava com o cachorro, flertava com a jovem esposa de um mecânico que morava nos fundos, fiz amizade com uma stripper que morava na frente. Estaria no hipódromo por volta da uma da tarde, retornaria com meu lucro, depois sairia com o cachorro até o ponto de ônibus para esperar Betty voltar para casa. Era uma boa vida.
Então, uma noite, Betty, minha adorada, me aplicou esta, ao fim do primeiro copo:
Hank, não aguento mais!
Não aguenta o quê, baby?
A situação.
Que situação, chuchu?
Eu trabalhar e você ficar aí, largado. Todos os vizinhos pensam que eu te sustento.
Caralho! Eu trabalhava e você ficava aí, largada.
É diferente. Você é homem, eu sou mulher.
Ah, não sabia disso. Pensei que vocês mulheres estivessem berrando por direitos iguais.
Sei o que está rolando entre você e a poço de banha ali dos fundos, ela fica andando na sua frente com os peitos de fora...
Peitos de fora?
Sim, PEITOS DE FORA! Aquelas tetas brancas de vaca leiteira!
Hmm... são mesmo grandes.
Viu? Você está de olho nela!
Escuta, mas que diabos está acontecendo?
Tenho amigos por aqui. Eles veem o que está acontecendo!
Não são amigos. São fofoqueiros dissimulados.
E essa puta aí na frente, que finge que é dançarina?
Ela é puta?
Se o cara tem um pau, é o bastante para ela.
Você enlouqueceu.
Só não quero que toda essa gente pense que estou sustentando você. Toda a vizinhança...
Fodam-se os vizinhos! Por que devemos nos importar com o que eles pensam? Nunca demos bola para isso antes. Além disso, sou eu quem paga o aluguel. Sou eu quem paga a comida! Ganho meu dinheiro nas corridas. O dinheiro que você ganha é seu. Nunca foi tão fácil para você.
Não, Hank, acabou. Não aguento mais isso!
Levantei-me e me aproximei dela.
Ora, vamos, baby, você só está um pouco estressada essa noite.
Tentei agarrá-la. Ela me empurrou.
Está bem, puta que pariu! — eu disse.
Retornei para minha cadeira, terminei meu drinque, tomei outro.
Acabou — ela disse —, não durmo nem mais uma noite com você.
Está bem. Guarde bem essa sua boceta. Não é lá grande coisa.
Quer ficar com a casa ou quer se mudar? — ela perguntou.
Você fica com a casa.
E o cachorro?
Você fica com o cachorro — eu disse.
Ele vai sentir sua falta.
Fico feliz que pelo menos alguém vá sentir minha falta.
Levantei-me, fui para o carro e aluguei o primeiro lugar que encontrei com uma placa de aluga-se. Me mudei naquela noite.
Tinha acabado de perder três mulheres e um cachorro.

Charles Bukowski, in Cartas na Rua

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