É
assim desde que somos crianças: você é mais bonita que a Dudinha.
E mais esperta do que a Manu. A Lelê não faz contas tão bem quanto
você, querida. E seu sapato é mais bonito que o da Maria. Enquanto
isso os meninos estão em paz, correndo juntos, dando risada por aí.
Somos
ensinadas a competir. A nos incomodar com a presença de novas
garotas. A procurar defeitos nelas desde o momento em que aparecem na
porta. Somos incentivadas a excluir mulheres, seja porque elas
supostamente nos ameaçam ou porque supostamente não são “tão
boas quanto nós”.
Essa
rivalidade, tão boa e tão interessante para o machismo e para toda
a imensa parcela do mundo que tem medo de mulheres unidas, é
potencializada pelo beijinho prazinimiga, pelo beijinho pras
falsianes e pelo beijinho pras recalcadas. Não estou dizendo que não
haja inimizade, falsidade e recalque sobrando por aí. Mas se nossa
língua machista sempre torna o sujeito masculino, ainda que no caso
haja mil mulheres e um único homem, por que deixar as inimigas,
falsianes e recalcadas no feminino? Não há homens traiçoeiros
soltos por aí?
Quando
vemos Melania Trump plagiar o discurso de Michelle Obama, devemos nos
indignar. Devemos achar tão absurdo e ridículo quanto é. Isso não
quer dizer que devemos achar que as duas são inimigas e que deveriam
entrar num ringue para puxar cabelos enquanto berram xingamentos
estapafúrdios. Trump e Obama não fariam isso. Por que as mulheres
haveriam de fazer? Um plágio entre mulheres é tão grave e sério
quanto um plágio entre homens. E só.
A
inimizade entre mulheres dá ibope, manchete e dinheiro. Parece ser
divertida, cômica e sanguínea. Ver uma mulher cair do salto alto
parece ter graça, enquanto ver um homem pisar no cadarço não.
Parece que ela merece e que ele deu azar. Mas isso tudo é uma grande
cilada.
Mulheres
deveriam ser as primeiras a não julgar a roupa de outra mulher. A
promoção de outra mulher. Os medos de outra mulher. Os defeitos de
outra mulher. Porque, como dizem por aí, com a mesma severidade com
a qual julgamos, seremos um dia condenados. E a vida de uma mulher é
ser condenada diariamente: por estar gorda, por ser bonita demais,
por chegar muito tarde, por não ser mãe, por trabalhar demais, por
não casar. Precisamos colaborar com essa dinâmica errada?
Mário
Quintana dizia que só acreditava na amizade entre duas mulheres se
uma delas fosse muito velha ou muito feia. Ele apenas verbaliza a
competição que nos imputam desde o princípio. Mas já é hora de
virar o jogo. Amigas, as mulheres nem sempre serão. Mas inimigas
presumidas, isso elas nunca haverão de ser.
Porque
mulheres não são inimigas. Mulheres são as que passam papel
higiênico por cima da porta quando o papel da sua cabine acabou.
Mulheres são as que podem te oferecer um absorvente numa emergência
ou um peito para seu filho. São as que entendem suas dores. São
aquelas que deveriam ser as primeiras a estender a mão e nunca as
primeiras a apontar o dedo.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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