segunda-feira, 1 de maio de 2023

O mundo é um moinho | Cartola, 1976


Clássico dos clássicos do mestre da Mangueira, “O mundo é um moinho” veio ao mundo como a faixa de abertura de seu segundo álbum solo, Cartola (Discos Marcus Pereira), em 1976. Então aos 67 anos, ele tinha escrito esse samba-choro poucos meses antes de voltar ao estúdio. Numa idade em que muita gente já caminhava para a aposentadoria, o compositor mantinha acesa a chama da criação e, nesse mesmo álbum, também lançou duas outras preciosidades até então inéditas, “Minha” e “As rosas não falam”.
Um ano após ser lançado pelo compositor, “O mundo é um moinho” ganharia outra versão memorável, de Beth Carvalho, no disco Nos botequins da vida (RCA). A partir daí, muitas gravações se seguiram, até chegar ao roqueiro Cazuza, reafirmando a abrangência da obra de Cartola. O encadeamento perfeito da melodia e dos versos mostra um fino artesão da canção, garantindo lugar para “O mundo é um moinho” em qualquer antologia da música brasileira.
Cartola sempre negou que a letra tão íntima e emocionada fosse autobiográfica ou confessional, como tantas de suas canções. Conta que teria se inspirado em uma desilusão amorosa, mas de sua enteada, filha de Dona Zica, para criar a letra. O tom é coloquial, como uma conversa de alguém bastante sofrido e experiente alertando sua jovem interlocutora sobre as mesquinharias do mundo, que, como um moinho, pode triturar os seus sonhos e reduzir suas ilusões a pó.
Uma curiosidade na gravação original de Cartola é a participação do então iniciante Guinga. É dele o violão na marcante introdução, ao lado da flauta de Altamiro Carrilho. Antes de se consagrar como compositor, o então também dentista se alternava entre o consultório e os palcos e os estúdios. Não é absurdo imaginar que a experiência com o mangueirense influiu na opção de Guinga pela música.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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